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sábado, 20 de outubro de 2018

OUTROS TEMPOS: PRODUÇÃO DE CHICÓRIA NA POVOAÇÃO


Dentro das produções agrícolas da freguesia de Nossa Senhora dos Remédios, vislumbrava-se nos seus terrenos, grandes sementeiras de chicória.

Os terrenos tinham que ser muito bem removidos, quer com arrados, quer com sachos, para que todas as ervas daninhas ficassem bem enterradas, de forma a não dificultar o nascimento da chicória.

O período de sementeira era feito no decurso dos meses de fevereiro e março. O processo era efetuado através de uma pequena máquina de características artesanais. A semente vinha de fora.

Uma vez germinada, primeiramente sachava-se, depois desbastava-se e mais tarde era mondada. A colheita era feita no final do ano.

Na freguesia de Nossa Senhora dos Remédios existiam três fábricas de chicória: a de Francisco Luiz de Melo, sita à Mó, a de Dinis Cabral, situada no Feital e a de Dâmaso, na Ribeira dos Bispos.

Fonte: Retalhos de Memórias de José de Almeida Mello.

Saiba o que é a Chicória Industrial e para que servia 

A raiz da chicória para “café” atinge em média 25 a 30 cm de comprimento e 5 a 8 cm de diâmetro, podendo ir além destas dimensões caso o solo apresente condições favoráveis.”

É na Europa que a cultura da chicória apresenta uma maior expressão, sendo efectuada sobretudo na Bélgica e França, mas também na Polónia, Espanha, Portugal, Croácia e Cazaquistão. No entanto, esta cultura é feita também em outras regiões do mundo, em países como a África do Sul, Filipinas e Porto Rico (FAOSTAT, 2009).”

ASPECTOS GERAIS DA CHICÓRIA INDUSTRIAL

História e Divulgação

Ao que se sabe, a palavra chicória deriva do termo árabe “Chikoùzych”, usado para designar esta planta, originária da região do mediterrâneo, muito utilizada como planta alimentar e medicinal desde a mais remota antiguidade, sendo a sua cultura efectuada há mais de dois mil anos, segundo a bibliografia desde o séc. IV a.C. (Maier 1987; Januário, 1999).

A chicória era muito familiar aos gregos que lhe chamavam “Kichorion”, tendo-a conhecido através dos egípcios que a denominavam por “Cichorium”, fazendo dela largo uso como planta medicinal, alimentar, e também já como bebida (Ruella, 1915; Maier, 1987; Delesalle e Dhellemmes, 1992a; Van Loo et al., 1995).

Também entre os romanos lhe era consagrado um lugar de destaque, não só como alimento bem como uma planta destinada ao uso medicamentoso, sendo indicada para várias doenças.

Plínio recomendava-a para a cura de doenças do fígado e do aparelho digestivo, bem como dissipadora de dores de cabeça. A infusão das suas raízes e folhas era também aconselhada pelos romanos como reguladora dos fluxos menstruais, e ainda como abortiva.

Os magos dessa altura aconselhavam-na como panaceia milagrosa aos que desejassem ver realizados os seus desejos. Para tal, deveriam untar todo o corpo com uma mistura de sumo de chicória e de azeite.

Esta planta foi objecto de várias referências por autores clássicos da antiguidade, tais como Vergílio, Theofrasto, Plínio e outros como Horácio. Este último revela, numa consagração a Apolo, o lugar que lhe destinava como alimento afirmando:” Para mim, a oliveira, a chicória e a malva são o bastante para os meus festins” (Ruella, 1915).

Quer a chicória cultivada para utilização industrial das raízes, quer a utilizada para consumo alimentar das folhas e que é conhecida entre nós por almeirão, derivam da chicória selvagem (Cichorium intybus L.). Desde esta planta espontânea, com as suas características flores azuis ainda hoje abundante nas bermas dos caminhos, até às variedades desta espécie actualmente cultivadas na Europa, foi efectuado um enorme trabalho de melhoramento com base numa intensa e cuidada selecção de semente.
A cultura da chicória data pelo menos 1000 anos antes da descoberta da planta do café nas montanhas da Abissínia e pensa-se que na Europa se consome a bebida preparada a partir das raízes torradas, desde a Idade Média, muito antes do café ser conhecido. Contudo, a raiz da chicória aparece conhecida e consumida como “café de chicória” desde há cerca de três séculos.

Este uso hoje tão divulgado foi, de acordo com Ruella (1915), criado sobretudo pelos holandeses na última década do séc. XVII. Porém, esta indústria surgiu na Holanda só em 1773, estando até esta data a torrefacção das raízes da chicória circunscrita ao domínio doméstico, utilizando os holandeses para o efeito o forno onde coziam o pão. Da Holanda a sua utilização passou à Bélgica, para onde foi levada por dois belgas conhecedores da cultura e sua transformação, os quais, em 1801, instalaram a chicória nas suas regiões de origem, Liége e Onnoing, e aí fundaram também duas fábricas de secagem e torrefacção das raízes. Na Alemanha, em Brunswick, em 1760 foi implantada a primeira fábrica de torrefacção, com obtenção desse novo produto em pó, a qual conheceu um enorme sucesso (Maier, 1987). Na França a chicória também aí se fixou na segunda metade do séc. XVIII, atingindo um enorme desenvolvimento, o qual persiste até hoje, tendo-se criado o hábito do consumo da sua bebida, sendo por isso esta cultura largamente divulgada. No início do séc. XIX, durante o Bloqueio Continental, o consumo desta bebida como substituto de café alargou-se praticamente a todo o continente europeu (Maier, 1987). Assim, até inícios do séc. XX., a cultura chegou a outros países da Europa e a outras regiões do mundo. A produção de chicória e a sua utilização como bebida, durante os séculos XIX e XX, passou por diversas fases (Pazola, 1987): desde o seu uso como substituto total do café a, posteriormente, ser adicionada ao café ou usada em misturas de sucedâneos conjuntamente com outros cereais torrados.

A Chicória em Portugal

Introdução da Cultura em Portugal

Em Portugal continental esta cultura foi introduzida mais ou menos em 1889, por um oficial do exército, que numa das suas viagens ao estrangeiro, ao passar pela Bélgica, França, Holanda e Alemanha, se apercebeu do incremento da cultura da chicória nesses países, e trouxe algumas sementes que deram origem à instalação da cultura perto de Aveiro (Ruella, 1915). A cultura acabou por se estender a vários concelhos do distrito de Aveiro, iniciando-se também o seu processamento, ainda que de forma bastante rudimentar, o que terá condicionado, então, o êxito do empreendimento.

A cultura da chicória e as pequenas indústrias de torrefacção das suas raízes surgiram nos Açores também na segunda metade do século XIX, como aliás outras indústrias ligadas ao sector agrícola: beterraba sacarina, tabaco e mais recentemente os lacticínios. Ao que se sabe a cultura da chicória como sucedâneo de café foi introduzida nos Açores por um cidadão belga na última década daquele século (Ruella, 1915).

Evolução da Cultura nos Açores e em Aveiro

Nos Açores, no princípio do século XX, a cultura da chicória fazia-se apenas na ilha Terceira (Ruella, 1915). De acordo com Oliveira (1981), foi efectuada também durante muitos anos na ilha do Faial e posteriormente a sua cultura restringiu-se apenas à ilha de S. Miguel, tendo-se assistido a uma maior concentração e especialização da actividade industrial ligada a estacultura, com o encerramento de algumas das fábricas de secagem e torrefacção das raízes.

Nos anos 70 a produção anual de chicória chegou a ultrapassar as 40 000 toneladas e a área cultivada os 1200 ha (Januário, 1999). Contudo, a partir dos anos 80 assistiu-se, a um decréscimo da actividade agro-industrial ligada às culturas industriais acima referidas, tendo-se vindo a verificar um predomínio da indústria dos lacticínios.

Assim, desde sensivelmente a última década do séc. XX, houve uma grande quebra na exploração industrial da cultura da chicória, reduzida a uma unidade de secagem e torrefacção na ilha de São Miguel, a fábrica de São Roque, com uma capacidade de 3000-3500 t / ano (Januário, 1999) e cuja produção se destinava ao Continente e minoritariamente à exportação.
A chicória que a abastecia provinha de pequenas explorações familiares, caracterizadas por populações de plantas mais densas e adubações mais deficientes que as praticadas noutros países europeus onde a cultura tem maior expressão. Em 1998 foram colhidas apenas 2800 t de raízes, tendo sido cultivados não mais de 66 ha. As causas desta acentuada redução da cultura e sua transformação são várias, com realce para a baixa rendibilidade da exploração, determinada pelos elevados custos de produção, especialmente em mão-de-obra. O proprietário daquela unidade de transformação das raízes (secagem e torrefacção) acabou por transferi-la para o Continente, onde está implantada desde há cerca de uma década.


Povoação, sábado, 20 de outubro de 2018

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