“...a
vida açoriana insistia numa/ mediocridade deliciosa, feita de mar/ e de lava, e
do que o mar e a lava/ precipitam: sargaços, peixes, piratas,/um pouco de
enxofre e sismos./Neste círculo se apertava a vida do/ açoriano, até que a
sedução do mar/ envolvente se tornava mais forte do/ que ele. Vinha a
emigração.” Vitorino Nemésio, “Açorianidade” [II], Correio dos Açores, 6.9.1932
As
ilhas fazem parte de nós, catarinenses do litoral Sul. A Ilha de Santa
Catarina, portal de entrada dos seis mil açorianos que, de 1747 a 1756,
atravessaram a vastidão atlântica cortando hemisférios, arpoando a esperança na
procura de dias melhores em terras Vera Cruz, e as nove Ilhas do arquipélago dos
Açores – Santa Maria, São Miguel, Terceira, Graciosa, Faial, Pico, São Jorge,
Corvo e Flores – lugar de origem, ponto de partida dos nossos antepassados,
povo errante que se espalhou pelo mapa do mundo, atravessou mares levando a
ilha dentro de si.
Nos
Açores, o Sul do Brasil encontra o alargamento de seu passado e na açorianidade
o seu patrimônio cultural. Um legado que, transmitido por tantas gerações,
alcança o século XXI como identidade cultural construída no tempo e no espaço
telúrico. Sinônimo de luta pela sobrevivência com dignidade, marco legal na
construção do Mundo Novo.
Somos
catarinenses, brasileiros. Somos ilhéus açorianos, portugueses. Por nossas
crenças e tradições seculares, nosso acervo espiritual irrefutável – a matriz
cultural. Sim, somos açorianos por direito de herança dos nossos antecestrais
que um dia deixaram o porto de Angra, na Ilha Terceira, sabendo que jamais
voltariam...
Se
o sangue açoriano diluiu no passar das gerações, ao se misturar a tantas outras
etnias que dão cara ao povo de Santa Catarina, numa composição de
multiculturalidade e diversidade, hoje mais do que nunca, é um rio de afetos a
correr-nos nas veias e a desaguar diretamente ao mar do coração, reafirmando a
nossa condição de “açoriano”, a nossa identidade cultural de raiz.
Na
segunda-feira do Espírito Santo, dia 9 de junho, o Mundo Açoriano celebrou o
Dia dos Açores, como símbolo da “afirmação da identidade dos açorianos, da sua
filosofia de vida e da sua unidade regional - base e justificação da autonomia
política que lhes foi reconhecida e que orgulhosamente exercitam” (cf. Decreto
no 13/80 A de 21/8/1980).
Como
parte do universo açoriano que se estende dentro e fora dos Açores, numa
afirmação identitária, sinto-me “de casa” para celebrar a significativa data e
reverenciar os meus ancestrais, pilares da minha família, aqui chegados no
século XVIII, humildes açorianos povoadores desta terra abençoada por Santa
Catarina: José Francisco Vieira e Ana Rosa Joaquina Siqueira (Norte Grande,
Ilha de São Jorge); António Nunes Curvelo Filho (Altares, Ilha Terceira) e Ana
Maria do Nascimento (Urzelina, Ilha de São Jorge); António Nunes Curvelo
(Altares, Ilha Terceira) e Maria Francisca da Conceição Melo (Biscoito, Praia
da Vitória, Ilha Terceira). Pedro Machado de Ávila (Agualva, Praia Vitória,
Ilha Terceira) e Maria Machado (Norte Pequeno, Calheta, Ilha de São Jorge);
João Machado Lopes e Felícia Rosa de Jesus (Ilhas Terceira e Pico); Tomaz
Francisco de Faria (Ilha do Faial) e Bárbara Francisca da Conceição (Ilha de São
Miguel). José Machado Pacheco e Rosa Maria de Jesus; José André da Silva e
Maria da Encarnação (Ilha do Pico); José Agostinho Cardoso e Clarinda Anna de
Jesus; Francisco António Martins de Oliveira e Luiza Maria Oliveira (Ilha
Terceira).
Um
grande abraço a todos os açorianos que vivem nas nove Ilhas dos Açores, aos
açorianos que vivem nas comunidades da diáspora e àqueles que, como Eu, são
açorianos de 266 anos e levam os Açores por baixo da pele e no coração.
(Título
original: Celebrar o Dia dos Açores como uma açoriana de 266 anos)
LÉLIA
PEREIRA DA SILVA NUNES
Professora
universitária
Florianópolis,
Brasil
Fonte:
mundoaçoriano
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