Fora o Padre Ernesto Jacinto Raposo, cometido de prolongada doença nervosa. E o seu estado de profunda depressão física, exigia absoluto repouso, além de especiais cuidados médicos.
Estes, aconselhavam como boa terapêutica, uma viagem até aos Estados Unidos da América do Norte.
O Prelado Diocesano, D. António Augusto de Castro Meireles, embarcara para lá, havia pouco tempo, no dia 22 de abril do ano de 1926.
Punha-se, portanto, o problema da sua ausência. Coadjuvava-o, o Padre José de Paiva Amaral. A doença, acentuava-se, dia a dia, para pior, até que o senhor Padre Ernesto resolve partir para a América, à procura de melhoras. E lá vai.
Ao chegar a New-Bedford, hóspede de Monsenhor Pacheco Vieira, procura, logo, o seu Bispo.
D. António Meireles ao vê-lo, exclama, admirado:
- “O senhor Padre Ernesto por aqui?!...” a que ele responde, sorridente:
- “É verdade. Venho pedir a V.ª Ex.ª autorização para ir à América tratar-me…”
O inteligente Prelado sorriu-se, achando imensa graça aquela extravagante maneira de pedir e concedeu-lhe a autorização indispensável, acrescentando:
- “Com uma condição:
“Que estivesse o tempo necessário… e voltasse, de novo, para a Povoação.”
E assim aconteceu. Por lá andou dilatado tempo – aproximadamente dois anos – visitando todas as paróquias de micaelenses, nomeadamente, todos os povoacenses.
E por toda a parte, sempre o mesmo. Tinha de pregar. E pregou vezes sem conta. E visitou vários Estados norte-americanos.
O tempo corria e já na Povoação surgiam ressentimentos por uma tão prolongada ausência…
Houve quem aventasse:
- “O senhor Padre Ernesto já não se importa com a gente…”
E outros:
- “Desgostou-se da Povoação…”, “Não quer saber dela…”
E ainda:
- “Já não volta cá!”
E em todas estas afirmações transparecia certa mágoa que bem se lhes lia nos corações principiando a ser feridos pela dúvida.
Não era verdade.
O senhor Padre Ernesto, também andava acicatado pelas saudades da sua querida Povoação e da sua gente. E dizia, então, assim:
“- Não
sei porquê!?... Tenho visto muitas caras… tantas caras!… Mas
só as da nossa gente acho graça. São lindas!... Frescas, alegres!...”
E
continuava, num crescente de entusiasmo:
- “Que
belas as caras frescas das nossas lindas raparigas!... até os nossos
rapazes… acho-os diferentes de todos os outros…”
Por alturas do ano de 1928, anuncia o senhor Padre Ernesto o seu ansiado regresso à Povoação.
Grande alegria invade, então, todos os povoacenses. Uma grande receção vai ser preparada. E lá estavam, à entrada da Vila, as autoridades administrativa e judicial, todos os funcionários públicos, e os seus inúmeros amigos e uma mole imensa de povo, conjuntamente com a banda de música Lyra de Euterpe.
De todas as varandas pedem colgaduras e o caminho por onde vai passar está todo juncado de flores até à sua residência.
Uma grande girandola de foguetes anuncia a sua chegada.
Mãos juvenis, entregam-lhe um lindíssimo ramo de flores e recebe, ali, os primeiros cumprimentos das autoridades.
Primeiramente, o Presidente da Câmara; depois, o Juiz da Comarca e o Delegado do Procurador da República; os amigos e ao som da música e sob uma chuva ininterrupta de palmas de mistura com pétalas de flores, atravessa o senhor Padre Ernesto a parte central da Vila, a caminho de sua casa, seguido desta enorme multidão.
Aí, novamente, os seus íntimos saúdam-no em vibrantes explosões de alegria.
Cá fora, o povo bate palmas e vai-se comprimindo, cada vez mais. Parece não ter fim aquela expressiva manifestação de apreço.
Como é natural, ele traz estampado, evidentes sinais de fadiga. A seu lado, ficara um velho e dedicado amigo, Horácio Enio de Amaral e Serra a quem, em confidência sorridente, perguntara:
- “Ainda haverá mais algum número do programa para cumprir-se?”
Era bem o regresso do seu velho e tão conhecido bom humor…
Transcrito por: Pedro Damião Ponte
Fonte:
Livro de Francisco Botelho (1958) | O Padre Ernesto Jacinto Raposo (1875 –
1940) Primeiro Ouvidor da Povoação (Subsídios para a sua biografia e história
do concelho)
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