Correio
dos Açores - Temos uma foto que mostra as banheiras das termas das Furnas
abandonadas nos estaleiros da empresa ‘Sanibetão’. Que comentários lhe merece este abandono?
Adelino Dinis
(médio, especialista em termalismo) - Não me ponha mais triste do que aquilo
que já estou. Está a dar-me uma notícia daquelas de arrepiar. Isto para mim é
uma coisa inconcebível que me dá uma tristeza imensa.

Foi
feito tudo contra a minha opinião, contra os meus pareceres, contra tudo e mais
alguma coisa. Aquilo tem aspecto até de uma legalidade muito duvidosa. Veja,
por exemplo, que aquele projecto foi lançado na perspectiva de que era uma
adenda. A adenda inicial até não era má, atribuía às termas um determinado tipo
de responsabilidades dentro daquilo que era possível mas nada disso foi
cumprido.
O
que iria ser uma reestruturação das termas acabou por ser transformado num
hotel. Limparam o termalismo de vez com meias coisas tolas como argumento.
Está a dizer-me que
destruíram a nascente de termas que havia lá?...
As
nascentes estão lá. Deram cabo foi de várias coisas. Por exemplo, acabaram com
uma característica muito importante das termas que era ter depósito de
arrefecimento. Mas, também, como eles não pensaram fazer grandes tratamentos
termais, acabaram com aquilo tudo e reduziram o termalismo a uma coisa mínima,
ínfima: uma piscina e duas banheiras. Julgaram que cumpriam, com isso, o
caderno de encargos, o que, na minha perspectiva, é errado.
O que é que
fizeram?

Ainda
por cima os quartos estão todos instalados a um piso que, como sabe, não é nada
habitável. São asneiras atrás umas das outras.
Estas
banheiras das termas das Furnas, agora abandonadas, são património.
Foram
bem caras. Na altura, foram escolhidas porque a água destruía tudo. Era
plástico, PVC, fibras de vidro, nada resistia. O que conseguia manter-se era
aquele modelo em mármore. Foram feitas, custaram um dinheirão, foram aplicadas
mas mal foram usadas. Já na altura, o processo foi mal conduzido. Isto
aconteceu no último governo do PSD. Depois veio o primeiro governo do PS, houve
ali um entusiasmo inicial mas, enquanto não escangalharam tudo outra vez, pondo
isso nas mãos dos privados, não descansaram. Quiseram entregar o ‘menino’ e foi
mal entregue. É assim, o que lhe hei-de dizer mais?...
O que se pode fazer
com aquelas banheiras e todo o equipamento?

Como médico e
especialista na área do termalismo, o que se pode fazer com aquelas banheiras?
Nada,
eles não têm onde as colocar. Acabaram com o destino delas que era servirem o
termalismo em termos de banhos de emersão com águas sulfúricas. Não é isso que
está no projecto futuro, portanto, acabou-se. A não ser que, no futuro, as
termas voltem a ser reanimadas com outra perspectiva. Mas, no contexto actual,
nem pensar. Não vejo vontade nem, sequer, há dinheiro para isso.
É
património que está em degradação…

Foi
uma asneira danada retirar as termas na secretaria da Saúde. Eu, na altura,
também tive um pouco de culpa nisso. O objectivo é que fosse para a Economia
porque havia mais dinheiro e havia possibilidade de as dinamizar. Havia a
vertente económica que era preciso reabilitar. De facto, não é só tratamentos,
também tem alguma coisa em termos de impacto turístico, impacto económico.
Alinhei, na altura, um bocado nisso, mas, depois, não foi nada concretizado
daquilo que foi previsto.
O secretário do Turismo
disse no Parlamento que quer certificar as termas dos Açores…
Quer o quê?
…Certificar as termas dos
Açores…
Os
governantes arranjam meia dúzia de argumentos para fazerem um discurso e, na
prática, é só contradições de toda a ordem.
Na
saúde, por exemplo, diz-se que é preciso poupar e centralizar serviços e os
resultados não são grande coisa. Pelo contrário, os profissionais andam todos
desmotivados e desanimados.
Voltando
às termas das Furnas…
Sabe,
nem me fale mais nisso. Eu vou todos os dias para a Povoação e até olho para o
outro lado para não olhar para aquele edifício. Foi um delapidar de dinheiro.
Foi um delapidar de recursos. Foi um delapidar de património sem rei nem roque,
sem controlo, sem nada.
Foi
uma das coisas que deixaram ao ‘Deus dará’ e está na situação em que está.
Aquilo
nunca mais vai ser recuperado. É difícil. Pode ser que um dia estas banheiras
voltem outra vez ao seu lugar primitivo que era aí que deviam estar. Mas, não
sei se isso acontecerá. Tudo tem a sua oportunidade nesta vida e há coisas que
se perdem e, depois, para recuperar, nunca mais.
Eu
tive oportunidade de chamar a atenção para o que acabou de acontecer. Mas não
ia fazer uma revolução por causa disso. Ninguém ligou ao que eu escrevi. E está
à vista o que se vê. E eu também tenho de pensar em outras coisas para não
ficar frustrado.
Fonte:
Correio dos Açores, escrito por João Paz
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