Fomos
pesquisar na net algo sobre o Pe. Silvino Amaral e encontramos no site www.ribeiraquente.com esta interessante
entrevista realizada à volta de 7 anos atrás, que vale a pena ler, pois
trata-se da interessante história de vida deste nosso conterrâneo.
ENTREVISTA
AO PADRE SILVINO AMARAL
A
5 de Fevereiro de 1934 nasce no Morro da Povoação Silvino Amaral, Filho de
Júlio d’Amaral e de Maria de Lurdes Medeiros. Em 1946, entra no seminário de
Angra do Heroísmo; a vocação, diz, derivou da sua educação familiar,
principalmente da parte da mãe. Para além disso, o seu irmão mais velho havia
ingressado no seminário mas voltou cedo sem chegar a conclui-lo. Nessa altura
Silvino Amaral muito desgostoso prometeu-se que se fosse também para o
seminário tudo faria para chegar ao fim.
Os
estudos foram financiados por um Tio e também seu Padrinho de Baptismo, o Padre
Silvino Raposo. Seguiram-se 12 anos de Seminário, num ambiente de rigor e
disciplina, que ainda lhe despertou mais a vocação. Depois veio a colocação na
Sé de Angra, por um período de um ano, no chamado post-seminário, um ano que o
próprio adjectivou de muito exigente, em que exercia a pastoral estando também
encarregue do sector dos jovens, para concluir com exames finais.
Terminado
o post-seminário, seguiu-se a colocação na Ribeira Quente, fruto de um acaso,
que já iremos descobrir. Hoje, com 72 anos, continua a celebrar a Eucaristia e
a estar ligado a diversos movimentos. Vamos aproveitar para conhecer o homem
por trás da batina e o legado de 47 anos de serviço à nossa paróquia.
Jornal Ribeira Quente – Como foi a sua primeira viagem para o
Seminário, quando entrou em 1946?
- Pe. Silvino Amaral – No ano em que
entrei houve um grande ciclone e a viagem de barco foi adiada. A entrada seria
em Setembro mas naquele ano só entramos em Outubro. Fui num navio chamado
Guiné, ainda com mau tempo. O navio ia todo de lado e todos os passageiros
vomitaram, mesmo alguns marinheiros. Concluí nessa viagem, que se o mar era
sempre assim, não iria aguentar. Este foi um ano recorde na história do
Seminário, pois entraram 46 alunos.
R.Q. – Chegado à Terceira, como foi a adaptação?
-
Pe. Silvino Amaral – A princípio foi difícil. Eu já tinha uma ideia do que era,
pois meu irmão mais velho já me havia descrito, mas outros entravam sem a menor
ideia do que seria a vida no Seminário. Entramos no primeiro dia e recebemos a
indicação das nossas camaratas, de
como
fazer as nossas camas, da nossa bacia, e das regras de limpeza. Explicavam tudo
e neste aspecto a integração era boa.
Depois
havia uma sessão solene e seguiam-se 2 dias de retiro, que era chocante para os
mais novos, como eu, em que estávamos todo o dia sem falar com ninguém, o que
era muito difícil na nossa idade.
Os
silêncios eram impostos de tal ordem, que qualquer coisa levava à quebra e
originava o riso entre crianças tão novas.
Lembro-me
do Director Espiritual que tinha uma voz muito fina. Tínhamos de estar em
silêncio durante todas as meditações. Mas a primeira vez que ele começou a
falar a voz dele provocou o riso. Um dos meus colegas começou com um acto
ruidoso de contenção de riso que contagiou toda a gente e começamos todos a
rir. A partir daí, bastava ouvirmos os passos dele no corredor em direcção à
capela e já começávamos a rir. Ele nunca disse nada pois sabia que era coisa da
juventude, mas a situação tornou-se insuportável ao ponto do perfeito dos
miúdos ter de intervir, avisando que expulsaria o responsável pela risota se
esta continuasse. Esta é uma pequenina história, para perceberem como era
difícil para as crianças cumprirem o silêncio imposto.
R.Q. – Como era um dia no Seminário?
Pe. Silvino Amaral - Acordávamos às
5:30, fazíamos a oração da manhã e tínhamos missa. Depois seguia-se uma hora e
meia de estudo, que era o mais rentável do dia, pois estávamos fresquinhos. Só
depois tomávamos o pequeno-almoço. Após esta refeição tínhamos um intervalo de
meia-hora e começávamos em aulas de uma hora com intervalos de 10 minutos.
Chegada
a hora do almoço, íamos para o refeitório onde as perfeituras comiam em
conjunto e no maior silêncio. Depois do almoço tínhamos um intervalo de 2 a 3
horas em que praticávamos desporto.
No
resto do dia tínhamos mais 3 blocos de uma hora de aulas, intervalados com 10
minutos de descanso.
Depois
das aulas estudávamos o resto da tarde, até ao jantar e a seguir a este
tornávamos a estudar sozinhos sob rigoroso silêncio.
No
fim do dia rezávamos a oração da noite e o terço e deitávamo-nos pelas 9 horas.
R.Q. – Como era o Seminário? Como era a hierarquia
de um curso?
-
Pe. Silvino Amaral – Vivíamos num regime de internato absoluto. Saiamos aos
Domingos e Quintas-Feiras. Havia um dia por mês que passávamos fora do
Seminário, mas era sempre uma visita organizada, como um passeio pelo campo, e
se possível com muito desporto.
No
refeitório não falávamos uns com os outros a menos que fosse um dia festivo,
geralmente todos os Domingos, éramos autorizados a falar. Durante as restantes
refeições havia sempre um colega a ler um livro pedagógico. Enquanto
almoçávamos acompanhávamos livros inteiros.
As
obras de Júlio Verne eram das que se liam entre outras adequadas a jovens.
No
Seminário havia três escalões etários: os Miúdos, que eram os alunos do
primeiro e segundo ano e cujo patrono era S. Luís Gonzaga; os Médios, do
terceiro ao oitavo ano, que tinham por patrono S. José e, finalmente, os
Teólogos, do nono ao décimo segundo ano do curso. Os Teólogos já tinham outro
estatuto – tinham um quarto próprio para estudar entre outras regalias. Apanhei
uma fase evolutiva no Seminário em que os Teólogos passaram a ter refeitório
próprio onde havia sempre música clássica e gregoriana a tocar, ao mesmo tempo
que dispúnhamos de um guião onde vinha o nome de cada música, seu autor, seus
movimentos e a explicação do que significava. Se era uma ópera, vinha descrito
o que os actores estavam a interpretar durante o tema.
No
Seminário fazíamos também muito teatro.
R.Q. – Já falou que praticavam muito desporto,
quais os desportos oficiais e qual o que gostava mais?
- Pe. Silvino Amaral - Praticávamos o
futebol, o voleibol, o basquetebol e o andebol. Todos os dias havia desporto.
Cheguei a ser o coordenador dos desportos nos Teólogos.
Gostava
muito de futebol, mas tive uma lesão na rótula do joelho direito logo pelo segundo
ou terceiro ano. A bola com que jogávamos era pesada e eu tinha um físico mais
franzino daí não ter conseguido recuperar. Continuei a jogar futebol mas com
menor frequência.
Comecei,
então, a praticar mais os outros desportos. Entrei na selecção de voleibol do
seminário e era passador. Nasci no voleibol, pois a Povoação tinha grandes
equipas e desde pequenos praticávamos o voleibol. Foi um tempo áureo do
voleibol nos Açores.
A
nossa selecção do Seminário ganhava tudo. Fazíamos competições com o liceu, a
polícia e contra a base militar das lajes e ganhávamos sempre.
Também
entrei na selecção de basquetebol. Costumávamos jogar contra os estudantes do
liceu e a princípio perdíamos, no entanto, a nossa vontade de ganhar e atingir
a perfeição era tal, que praticávamos durante horas até que começamos a
ganhá-los também.
No
futebol o Lusitânia, campeão dos Açores na altura, quando queria um bom treino
para depois enfrentar as equipas de fora, convidava-nos. Nunca ganhámos; para
nós um empate era uma vitória, e chegámos a empatar uma vez por outra. No passe
curto eles viam-se aflitos para nos tirarem a bola.
O
nosso maior problema era a adaptação ao campo de dimensões legais.
Isto
para concluir que praticávamos muito desporto, durante muito tempo e com
qualidade.
R.Q. – Já ficamos com uma ideia de como funcionava
o Seminário e como passava os seus dias, mas agora temos de falar daí para a
frente. Em que data foi Ordenado e por quem?
- Pe. Silvino Amaral – Fui Ordenado a 15
de Junho de 1958 pelo Bispo D. Manuel Afonso de Carvalho.
R.Q. – Seguiu-se um ano de Post-Seminário, como
funcionava?
- Pe. Silvino Amaral - Tínhamos aulas
durante o dia e exercíamos a pastoral da paróquia. Fiquei na Sé de Angra do
Heroísmo. Tudo o que fazíamos era alvo de avaliação. Os nossos sermões eram
comentados e todo o trabalho ligado à pastoral analisado. O meu coordenador foi
o Monsenhor Pereira da Silva, Vigário-Geral e pároco da Sé na altura. No fim
tínhamos um exame. Lembro-me que tive 16 valores.
R.Q. – Quando celebrou a primeira missa?
-
Pe. Silvino Amaral - Foi na Povoação, a 29 de Junho de 1958, quando estava de
férias, após ser Ordenado, e antes de fazer o Post-Seminário. Durante o curso
tínhamos as férias grandes no verão e voltávamos em Setembro ao Seminário, onde
se seguiam nove meses sem voltar a casa, foi numa dessas férias que celebrei a
primeira missa.
R.Q. – Qual a primeira vez que veio à Ribeira
Quente?
- Pe. Silvino Amaral – A primeira vez
que vim à Ribeira Quente foi ainda em Seminarista, e vim à festa de S. Paulo.
Lembro-me
de em criança fazer namoro à Ribeira Quente à distância. Via os barcos de
noite, entre a Povoação e a Ribeira Quente e achava o movimento interessante.
Sempre tivera curiosidade em conhecer o lugar para lá daquele pontão. No
entanto, o encanto desvaneceu-se quando cá vim a primeira vez, pois naquele ano
houve um grande temporal durante a festa e na altura vi que não era aquilo que
pensava.
O
Pe. Borges é que foi o convidado para celebrar a missa de festa em que Acolitei
como sub-diácono que já era.
R.Q – Como surgiu a colocação na Ribeira Quente?
- Pe. Silvino Amaral – Os meus colegas
do Post-Seminário foram consultados e depois foi-lhes indicado a paróquia onde
seriam colocados. Não fui consultado por não haver necessidade, mas cheguei à
conclusão, por exclusão de partes, que seria colocado na Água Retorta.
O
meu colega que ficara colocado na Ribeira Quente ficou preocupado, pois a fama
que a freguesia tinha era de muito atraso e de um povo sub-desenvolvido, para
além de ter a má fama que qualquer zona piscatória tinha. Assim que cá cheguei
pude constatar que não era verdade e que a ideia que as pessoas tinham não era
a correcta.
Um
outro colega nosso sabendo que eu era o melhor nadador do seminário, e que
vinha de uma terra ligada também ao mar, foi falar com o meu colega que tinha
ficado cá colocado e que era de uma zona mais ligada à lavoura, como a própria
Água Retorta, e disse-lhe, que já que estava preocupado com a colocação, porque
não pedia para trocar. Ele foi falar com o Monsenhor que concordou e fiquei
colocado então na Ribeira Quente. Minha mãe ficou muito contente e eu também
porque estava perto da família e tinha uma irmã ao meu cuidado.
R. Q. – Em que data que chegou à Ribeira Quente e
que Padre veio substituir?
- Pe. Silvino Amaral – Cheguei a 1 de
Agosto de 1959. Vim substituir o Pe. Antero Jacinto de Melo, que era da Ribeira
Quente e se encontrava à espera de visto para emigrar.
Fui
aconselhado a procurar casa, pelo Ouvidor da Povoação, pois o passal estava
rachado dos abalos de terra e oferecia risco. Lembro-me que vim uns dias antes
procurar casa. Percorri toda a freguesia e cheguei à conclusão que a melhor
casa da Ribeira Quente era o passal, para além de todos os riscos.
O
Pe. Antero havia tapado as fendas e caiado a casa. Esta só tinha uma mesa
grande e um louceiro vazio, pois o Pe. Antero tivera de vender as loiças para
pagar algumas despesas da paróquia.
Cheguei
cá com zero escudos na paróquia e lembro-me de ao fim de um mês, ter comprado
dois tapetes nos ciganos para a Capela Mór.
R. Q. – Como foi recebido pelas pessoas?
- Pe. Silvino Amaral – O Pe. Antero
apresentou-me ao povo na missa de Domingo. Quanto ao resto, percebi que não fui
muito bem recebido. O Pe. Antero tinha as pessoas na mão, porque dava
injecções, aconselhava remédios, além de boa pessoa era quem, para o povo, o
que sabia tudo, daí que as pessoas tenham dito na minha cara que eu podia ser
bom, mas como o Pe. Antero nunca mais haveria na Ribeira Quente. Era o medo da
mudança.
Eu
cortei com dar injecções (havia quem as soubesse dar na freguesia), e tentei acabar
com a figura do Pe. “sabichão”. Lembro-me que uma vez, logo no princípio,
alguém me perguntou onde tinha nascido um certo santo e eu ter dito que não
sabia. Foi um escândalo, com as pessoas a comentarem que: “foi para o Seminário
estudar e não sabe a vida dos santos?”, quando não é isso que aprendemos no
seminário nem é esse o objectivo do Seminário.
R. Q. – Mas o que achou do povo da Ribeira Quente?
- Pe. Silvino Amaral – Um povo simples,
bom e respeitador. Percebi que a economia passava pelos pescadores que se
orgulhavam de dar o meio quinhão para a Igreja. Eles lideravam o processo
económico cá dentro, ao contrário de pescadores como, por exemplo, de Rabo de
Peixe que, para além da má fama, eram mesmo má classe, diziam…
R.Q. – Que Igreja encontrou?
- Pe. Silvino Amaral – Uma Igreja de
tradição, muito praticante e calorosa. E ainda continua a ser, embora com as
quebras dos tempos.
R.Q. –
A missa era celebrada de costas para as
pessoas, concordava com este distanciamento? E na rua, como era a relação com
as pessoas?
- Pe. Silvino Amaral – Era considerado
um acto normal celebrar a missa de frente para o altar; era a linguagem da Igreja
na altura. Dominava mais o mistério do que o diálogo de proximidade.
Na
rua as pessoas eram simpáticas. O povo da Ribeira Quente sempre foi muito
celebrativo e comunicativo. Aqui aprendi muito e conquistei grandes amigos, que
Deus já chamou a Si. A Ribeira quente foi a minha Universidade de vida.
R.Q. – E a rivalidade
entre o lado do Fogo e da Ribeira, como lidou com ela?
- Pe. Silvino Amaral – Eu apanhei a fase
do abrandamento. Quando cá cheguei ainda havia alguma rivalidade mas já bem
pouca. Sei que antes era terrível. Havia torneios de voleibol cá e a competição
era intensa. O voleibol teve de acabar na freguesia para que não terminassem
grandes amizades devido à competição.
Também
os namoros entre um rapaz de um lado e rapariga do outro originavam disputas e
até mesmo esperas aos rapazes.
R.Q. – Em comparação com hoje em dia, acha que o
povo era mais alegre?
- Pe. Silvino Amaral – A alegria da
altura era mais espontânea. Havia muita pobreza mas muita alegria e convívio.
Este é um povo sem complexos. Aqui, a regras da delicadeza são ser amigo, ser
diálogo, ser fraterno.
R.Q. – Chegou a receber pagamentos dos serviços da
paróquia em géneros, como ovos, galinhas ou peixe?
- Pe. Silvino Amaral - Só num caso ou
outro é que acontecia, era muito raro. A Ribeira Quente foi das freguesias que
sempre lidou com moeda, devido aos vendilhões. Apanhei já o povo a usar
dinheiro embora muitos géneros e peixe fossem objecto de ofertas, que ainda
continuam.
R.Q. – Foi o fundador do escutismo na freguesia.
Onde apareceu o seu gosto pelos escuteiros e como surgiu o nosso Agrupamento?
- Pe. Silvino Amaral – Fui escuteiro no
seminário e era guia. Nasce daí o meu gosto. Tinha um temperamento introvertido
e devo a extroversão ao teatro e ao escutismo. Lembro-me de ser um dos três
escolhidos para ir ao 10º Acampamento Nacional em Avintes, no distrito do
Porto. O nosso escutismo era um dos melhores por se basear muito nos livros, no
que líamos. Interpretamos nesse Acampamento a Dança do Mogli, que foi muito
elogiada por ser bastante fiel ao que se lia, sem influências folclóricas e
comportamentais da região, ao contrário do que acontecia com os grupos de lá.
Quando
cheguei cá vi uma Ribeira Quente fechada, o que trazia resultados negativos de
linguagem – sem regras. Só havia a Liga Eucarística e a Acção Católica. Os
jovens estavam muito fechados e pouco organizados havia necessidade de se
abrirem para o exterior. A única vocação era o mar.
Comecei
logo a conversar com os amigos na necessidade de haver um grupo de encontro. O
Paulo Furtado, que tinha uma sapataria, é que foi o primeiro chefe dos
escuteiros. O Padre tinha o papel de assistente.
Sabia
que um bom escutismo faz-se com uma boa sede e pensamos cobrir o salão da
Igreja. O povo mobilizou-se e tivemos as madeiras de graça. Havia muitos Homens
sensíveis ao apostolado.
Este
edifício teve grande polivalência, pois servia o escutismo e o teatro que
também se começou a fazer na altura.
Houve
uma grande adesão da população e dos jovens, por se tratar de uma coisa nova,
mas que ainda hoje cativa muita gente.
R.Q. – Qual a maior diferença entre o escutismo da
altura e o actual?
- Pe. Silvino Amaral – O da altura era
mais fiel ao espírito, mais técnico e com grandes influências espirituais. O de
agora, depende do ambiente de modernidade. É um pouco o que o meio quiser. A
parte espiritual não está tão curada, a técnica também não. Não podíamos ver um
prego no meio dos campos…
R. Q. – Outros projectos que tenha implementado?
- Pe. Silvino Amaral – A Acção Católica
renovou-se, foi oficializada a nível nacional. Estruturei melhor a catequese,
com reuniões periódicas e introduzindo a obrigatoriedade de actas em todos os
grupos. A Liga Eucarística passou a ter reuniões de Cenáculo e a ser de homens
e mulheres em conjunto. Costumo dizer que «Deus cria-nos à mistura e os Homens
encarregam-se de criar separações». Criei Núcleo de Reflexão Bíblica, assentei
pequenos grupos Apostólicos e grupos de jovens organizados. Também nasceu a
Caritas, estando esta mais parada.
R. Q. - E o Centro Social, quando surge?
- Pe. Silvino Amaral – O Centro Social
surge em simultâneo com o escutismo e um pouco à volta deste. O Centro Social
não é o edifício, este foi construído em 1994, o Centro Social é o suporte do
meu projecto pastoral, assente nos jovens, nos grupos de formação e acção e na
acção social. É o teatro que se fazia, os cursos de culinária, rendas, bordados
e corte e costura que se fizeram no salão. As escolas de alfabetização para
adultos, os jogos de sala e mesa. Grandes torneios de pingue-pongue se
disputaram naquele salão.
Dentro
deste espírito destrói-se um jardim e aparece o campo de jogos, pois não havia
desporto e havia mais tendência para o futebol. Houve uma grande discussão por
parte do povo, contra a minha pessoa devido à destruição do jardim, mas o
espaço era necessário.
R. Q. – Como viu a tragédia do 31 de Outubro de
1997?
- Pe. Silvino Amaral – Foi o pior
episódio da minha vida e do qual continuo a ser vítima.
A
parte mais dolorosa caiu-me em cima dos ombros e sobre a minha figura de uma
maneira muito especial.
Apareceu
muita generosidade a nível mundial e gerir este dinheiro ainda hoje me faz
sofrer. Tudo o que mete dinheiro é fonte de sofrimento.
Em
cima dos acontecimentos trabalhei noite e dia, sem ninguém se aperceber, para
unir equipas e envolver a Junta e a Câmara e até mesmo o Governo Regional para
tentarmos canalizar verbas com a medida certa, tendo sempre tudo registado do
que entrava e saia e tratando de cartas de agradecimento às ofertas de
dinheiro.
Fiquei
muito ferido por dentro. Sentia-me “mimado” pelas pessoas e depois desse
episódio o diálogo quebrou, a minha pessoa foi alvo, e ainda por vezes é, de
muitas conversas de café e de esquina. Na Ribeira Quente sentia-me em casa e
hoje só me sinto bem fechado em casa. Felizmente já se está a retomar o diálogo
e as coisas vão voltando ao que eram mas, como disse, ainda continuo a sofrer
com aquela tragédia.
R. Q. – Um olhar sobre a Ribeira Quente hoje?
- Pe. Silvino Amaral – A Ribeira Quente
oferece perspectivas de desenvolvimento. É um lugarejo aprazível. Pode-se criar
núcleo de bem-estar e riqueza. Bem-estar económico não é ser rico, é não ser
pobre.
R. Q. – Recebeu uma medalha de mérito que consistia
em quê?
- Pe. Silvino Amaral - É uma condecoração de bons
serviços prestados à nação atribuída pelo Presidente da República. Foi-me
entregue pelo Ministro da República em representação do Presidente. Esta
medalha veio salvar a imagem da acção da Igreja aqui dentro.
R. Q. – Como se sente ao celebrar um Baptismo, um
Casamento e um Funeral?
- Pe. Silvino Amaral – O Baptismo
representa a continuidade da Igreja, pois hoje em dia há um baixo índice de
natalidade. É uma alegria para a Igreja. Acaba por ser um sentimento de
pertença acima de tudo – muitos pais são refractários em relação a várias
práticas religiosas, mas querem os seus filhos baptizados.
O
Casamento é o Sagrado nas pessoas e isso faz-me ficar contente, mas fico triste
com os casais que vão para o casamento de uma forma leviana e baseada em esquemas
sociais – “se não der certo não serei o primeiro a separar-me”. Perdem a noção
do sagrado.
O
Funeral é uma celebração de respeito para com as famílias e de homenagem, não
só aos mortos mas também aos vivos.
R. Q. – Senhor Padre Silvino, o Jornal Ribeira
Quente agradece-lhe a atenção dispensada ao longo destas quase três horas de
entrevista, fazendo votos que continue por muitos mais anos a servir a nossa
paróquia e a trazer mais-valias para a freguesia.
O nosso sincero obrigado em
nome de toda a população. Felicidades.
Fonte
e fotos: www.ribeiraquente.com
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