Numa
sociedade dominada pelo discurso político e pela permanente intervenção dos
poderes públicos – retirando dinamismo e pensamento crítico aos cidadãos -, é
difícil escolher um conjunto de personalidades que tenha marcado o ano que agora
terminou.
Aceito,
no entanto, o desafio que me lançaram e deixo aqui a minha lista, reflectindo,
obviamente, uma escolha muito pessoal e com critérios assumidamente
subjectivos.
JORGE RITA – É,
provavelmente, o dirigente associativo mais influente dos Açores. Os políticos,
de todos os quadrantes, de cá e de lá, fazem romaria ao seu gabinete. Pouco
exuberante, muito terra-a-terra, 'low-profile', fez um trabalho de bastidores
mais ou menos silencioso e com algum sucesso. Pegou na Associação Agrícola de
S. Miguel numa situação atribulada, pacificou-a, uniu-a, enriqueceu-a e
transformou-a num sector influentíssimo em todos os quadrantes. Sem grandes
alaridos, conseguiu quase tudo o que a lavoura reivindicou e fez tremer alguns
responsáveis políticos quando levantou mais a voz. É um caso raro de gente com
poder, sem que o poder lhe suba à cabeça. Vai ser uma voz central este ano, com
o fim das quotas leiteiras.
EDUARDO FERREIRA – Outra força da
mesma natureza. Sem se colocar nos bicos dos pés, sem grandes assomos de
mediatismo, abdicando da exposição pública exagerada que muitos empresários
adoram, está a construir um autêntico império de produtos açorianos a partir de
uma marca de Maracujá que se julgava quase extinta. No meio do silêncio
nortenho, este empresário ribeiragrandense e a sua família apostaram tudo na
iniciativa e brio profissional, investindo em contraciclo, criando postos de
trabalho, alargando a variedade de produção e levando o nome dos Açores para o
exterior. Está em força no continente, na diáspora e, em breve, em Cabo Verde.
FAMÍLIA BARCELOS – Outro símbolo da
qualidade de empreendedorismo familiar, ao criar o conceito da Quinta dos
Açores na ilha Terceira e, recentemente, em S. Miguel. A família terceirense
pretende expandir o conceito para outras paragens, o que é de louvar numa
região pouco ousada em termos empresariais. Vai ser mais um nome a fixar este
ano.
SÉRGIO MONTEIRO – O Secretário de
Estado dos Transportes descobriu o caminho aéreo para os Açores. Pôs no lixo as
propostas de Obrigações de Serviço Público do Transporte Aéreo do Governo
Regional e da Oposição e apresentou uma outra que é um ovo de Colombo. É o
exemplo, infelizmente, de que é preciso outros de fora virem mostrar aos
políticos de cá como é que se faz.
JOEL NETO – Com um futuro
promissor no exigente mercado continental, preferiu regressar à Terceira e, a
partir dos Quatro Cantos da Terra Chã, tem projectado os Açores, nos média
nacionais, com intervenções de grande lucidez e muita classe na escrita.
Simboliza aquilo que muitos sonham: que é possível regressar e, a partir daqui,
projectar as nossas ilhas para outra dimensão. Como se não bastasse, prepara o
lançamento, para este ano, do seu grande investimento: um romance inspirado nos
nossos ares. O que se pode pedir mais?
VAMBERTO FREITAS – Na mesma linha,
outro que já se tornou um clássico açoriano. “Exportou” para o mercado nacional
e internacional tudo o que se relaciona com a divulgação da produção literária
açoriana. Certeiro na crítica, conhecedor profundo da literatura de cá e da
lusa-diáspora, fez um trabalho voluntarioso em 2014 que mais nenhuma editora
faria. Espalhou por tudo o que é publicação nacional e internacional, ligadas à
literatura, o que de melhor se faz na escrita açoriana. Ele é, numa definição
básica, o elemento elevado à mais alta potência do que muitas Direcções
Regionais da Cultura juntas.
LUIS GIL
BETTENCOURT
– Outro que faria carreira promissora lá fora, tal como o irmão. Mas optou por
encalhar nestes rochedos e espalhou por todas as ilhas a sua mestria e paixão
pela música. Sem editoras e lobbies do meio, vai exercendo o seu perfume de
executante genial, agora ao lado da sua filha Maria. Fez um “remake” dos
Beatles com a Filarmónica Praiense, nas Sanjoaninas, simplesmente memorável. Merecia
levá-la a todas as ilhas.
PAULA TAVARES – Uma doente com
cancro que não se deixou afectar pelas consequências sociais da doença.
Expôs-se publicamente, sem medo, e bastou um grito de revolta, em forma de
carta, que se tornou viral, contra a injustiça do Serviço Regional de Saúde, no
que se refere aos apoios a doentes deslocados, para pôr todos os políticos em
sentido e alterarem a lei no parlamento. Encarna o espírito guerreiro de muitas
mulheres açorianas que não se deixam silenciar perante as adversidades, numa
sociedade cada vez mais egoísta e pouco solidária. Os Açores precisam de muitas
vozes com este espírito.
LIZUARTE MACHADO – O parlamento
regional é fraco. É um facto. Entre todos os deputados - em que metade poderia
ser dispensada – não é fácil escolher uma voz que se tenha destacado em 2014.
Há, pelo menos, um que mostrou ter pensamento próprio, sem se subjugar ao
partido: Lizuarte Machado. Na esteira de outros com espírito crítico e sem
bajulices, como foram os históricos Jorge do Nascimento Cabral e José Decq
Mota.
POLÍTICO ZERO – Olha-se para a
classe política em 2014 e o destaque é um deserto. A oposição arrastou-se e o
governo de Vasco Cordeiro desiludiu. Encontrar um político de excelência é
tarefa difícil, muito à imagem da líder máxima da soberania política açoriana,
a Presidente do parlamento. É o que temos...
Pico
da Pedra, Janeiro 2015
Osvaldo
Cabral
(Correio
dos Açores; Diário Insular; Multimédia RTP-A; Portuguese Times (EUA); Lusopress
Montreal)
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