Edição N.º 5095 do prestigiado e conceituado Jornal a Crença e com uma forte presença do Concelho da Povoação.
“As pessoas mais envolvidas vão ter saudades dos ‘quartos’, das ‘despensas’, das bênçãos do pão, da carne e do vinho, e também das ‘coroações’ e arraiais. É, realmente, muita e boa, a festa, para não sentir-lhe a falta!”
Parece que estamos a viver num sonho. Pesadelo, seria exagero de linguagem, pois trata-se, sem dúvida, de um viver estranho, misto de realidade e aparente ficção, com não pouca lógica e, ao mesmo tempo, muitos contrastes. Por um lado, o mal, o sofrimento, a morte. Por outro, a humanização de comportamentos e relações sociais, a solidariedade, por vezes heróica, a recuperação dos grandes ideais, o regresso aos valores e, até, às origens, os quais têm a ver com a saúde do ser humano, da vida animal, do nosso belo “planeta azul”, e também a apreciar mais o silêncio, a fazer a experiência da saudade, mesmo dos que estão perto de nós, a sentir de maneira mais aguda a falta que fazemos uns aos outros.
Já se sabe – e tem sido anunciado por responsáveis de autarquias, paróquias, associações, irmandades –, nem tão cedo vamos ter festas, as religiosas e as civis. A Páscoa foi o que foi, e pouco mais poderia ter sido, embora pudesse ter si menos em certas formas de manifestação, no mínimo, discutíveis. Também Vila Franca vai ter de passar sem a sua grande festa de São Miguel, com significado e dimensão a extravasar a Vila e a Ouvidoria, pois não é a nossa, a “ilha do Arcanjo”? Assim, este ano, a “procissão do trabalho”, de origem corporativa medieval, não vai sair à rua. Paciência... Por sua vez, a festa do mítico e poderoso Senhor Santo Cristo dos Milagres – que bom se os fizesse – irá pelo mesmo caminho. E outro tanto acontecerá com as popularíssimas e muito “açorianas” festas do Divino Espírito Santo, desde sem- pre tomadas pelo povo e que constituem expressão de fé, não erudita nem ritualista, como é relativamente comum na Igreja institucional, mas uma fé simples de entender, num Deus “Bom” Espírito que conforta, cura, salva os crentes e torna-os alegres e solidários. Daí, ser uma grande perda, para a Igreja e povo em geral, que não se realizem. Sobretudo as pessoas mais envolvidas vão ter saudades dos “quartos”, das “despensas”, das bênçãos do pão, da carne e do vinho, e também das “coroações” e arraiais. É, realmente, muita e boa, a festa, para não sentir-lhe a falta!
Parece que estamos a viver num sonho. Pesadelo, seria exagero de linguagem, pois trata-se, sem dúvida, de um viver estranho, misto de realidade e aparente ficção, com não pouca lógica e, ao mesmo tempo, muitos contrastes. Por um lado, o mal, o sofrimento, a morte. Por outro, a humanização de comportamentos e relações sociais, a solidariedade, por vezes heróica, a recuperação dos grandes ideais, o regresso aos valores e, até, às origens, os quais têm a ver com a saúde do ser humano, da vida animal, do nosso belo “planeta azul”, e também a apreciar mais o silêncio, a fazer a experiência da saudade, mesmo dos que estão perto de nós, a sentir de maneira mais aguda a falta que fazemos uns aos outros.
Já se sabe – e tem sido anunciado por responsáveis de autarquias, paróquias, associações, irmandades –, nem tão cedo vamos ter festas, as religiosas e as civis. A Páscoa foi o que foi, e pouco mais poderia ter sido, embora pudesse ter si menos em certas formas de manifestação, no mínimo, discutíveis. Também Vila Franca vai ter de passar sem a sua grande festa de São Miguel, com significado e dimensão a extravasar a Vila e a Ouvidoria, pois não é a nossa, a “ilha do Arcanjo”? Assim, este ano, a “procissão do trabalho”, de origem corporativa medieval, não vai sair à rua. Paciência... Por sua vez, a festa do mítico e poderoso Senhor Santo Cristo dos Milagres – que bom se os fizesse – irá pelo mesmo caminho. E outro tanto acontecerá com as popularíssimas e muito “açorianas” festas do Divino Espírito Santo, desde sem- pre tomadas pelo povo e que constituem expressão de fé, não erudita nem ritualista, como é relativamente comum na Igreja institucional, mas uma fé simples de entender, num Deus “Bom” Espírito que conforta, cura, salva os crentes e torna-os alegres e solidários. Daí, ser uma grande perda, para a Igreja e povo em geral, que não se realizem. Sobretudo as pessoas mais envolvidas vão ter saudades dos “quartos”, das “despensas”, das bênçãos do pão, da carne e do vinho, e também das “coroações” e arraiais. É, realmente, muita e boa, a festa, para não sentir-lhe a falta!
No que respeita às celebrações litúrgicas das últimas semanas, de notar a profusão de missas em igrejas de bancos vazios. Criativa e interessante, para mim, foi a ideia de um certo pároco que, não com contente com as ditas, deu-se ao trabalho de arranjar foto- grafias dos seus paroquianos e colocá-las nos lugares onde, presumo eu, costumavam ficar. E, assim, dessa forma curiosa, tornou- -os mais presentes na Eucaristia, que é e devia ser sempre celebração com e para o povo. Tiro-lhe o meu chapéu (ou o boné que tenho usado ultimamente)...
Como se vê, prefiro, nesta circunstância, rezar em casa. Mas foi precisa uma pandemia para fazer esta espécie de redescoberta do rezar sozinho, de transformar um tempo de oração, antes chato e insonso, numa experiência de fé de grande intimidade com Deus, o que, havendo sido óptimo, não substitui, longe disso, a oração com outros, sobretudo na Eucaristia.
Outra celebração, esta civil ou “cívica”, que não quero deixar de referir, foi o “25 de Abril”, que me proporcionou um dia de muitas e boas recordações, acentuadas com a troca de telefonemas entre amigos e amigas que, naquela data, sempre festejam o “Dia da Liberdade” e persistem em renovar os “ideais de Abril” como, aliás, tanta gente o fez por esse país fora. Apreciei quase to- dos os discursos proferidos na sessão, não tão solene como de costume, que se realizou numa Assembleia da República “confinada”... Mas, ainda mais gostei que muitos portugueses tivessem cantado, às varandas e janelas das suas casas, a música e poema da canção que deu o sinal de partida para a “revolução dos cravos”, ou seja, a “Grândola, Vila Morena”, de Zeca Afonso, a mais emblemática voz “de abril”.
Mas mais importante que tudo isso, foram (são) as iniciativas concretas, sem número, diversas e criativas, na área da solidariedade social e da fraternidade humana, inclusive de associações ligadas à Igreja.
A terminar, apraz-me partilhar com os leitores de “A Crença” duas citações que vêm muito a propósito deste tempo que andamos a viver. Foram tiradas de textos publicados recentemente na Revista Visão. Em primeiro lugar, uns versos de Sérgio Godinho: “Só há liberdade a sério quando houver / liberdade de decidir e mudar / quando pertencer ao povo o que o povo partilhar”. E esta outra, da escritora Dulce Maria Cardoso: “... O Sr. Américo mudou as janelas (as da casa da habitual cronista d’A Visão) num fim de semana e eu nunca mais ouvi o bulício da cidade. Não consigo perceber como é que agora ouço este silêncio todo lá fora”.
Pois, é a genialidade de quem, em poucas palavras, tem a arte de expressar o essencial do que nos vai na alma e a maioria de nós pensa, sente e vive!
Furnas, 28-04-2020
*(fechado em casa)
In Jornal Crença N.º 5095 de 30 de abril de 2020.
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