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terça-feira, 3 de fevereiro de 2015

GUARDO A FACTURA OU DEITO O PAPEL NO LIXO? TIRE AS SUAS DÚVIDAS SOBRE O NOVO IRS

Das facturas de transportes às despesas com filhos, do novo Portal das Finanças à devolução da sobretaxa. A reforma do IRS, já em vigor, foi alvo de uma sessão de perguntas e respostas com o secretário de Estado dos Assuntos Fiscais na Renascença.

O secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Paulo Núncio, respondeu esta segunda-feira às perguntas dos ouvintes e da Renascença sobre a reforma do IRS e o ajuste nas tabelas de retenção. Em Janeiro, muitos portugueses já devem ter sentido um aumento no vencimento líquido.

O ano passado correu bem ao Estado em termos fiscais. Arrecadou mais do que o esperado e para isto contribuiu o perdão fiscal. Este ano haverá novo plano para perdão fiscal?

Não. No ano passado a receita fiscal superou todas as expectativas e deveu-se a dois factores essenciais – por um lado, uma melhoria da actividade económica (há mais emprego, houve mais transacções e isso reflecte-se no IRS, no IRC e no IVA); por outro, houve um combate mais eficaz à fraude e evasão fiscal. Significa que aqueles que se habituaram a não pagar os impostos devidos pagaram mais impostos no ano passado. Isso determinou um aumento significativo da receita.

No ano passado não houve qualquer aumento de imposto nos três impostos mais importantes (IRC, IVA e IRS) e, no entanto, a receita nos três impostos aumentou. Há mais gente a descontar, há mais IRS cobrado e, por outro lado, há mais consumo privado, mais IVA, mais IRC, e por isso a receita desses impostos também aumenta. Isto significa que é possível, alargando a base, colocando mais gente dentro do sistema, aumentar a receita fiscal sem aumentar os impostos. Foi o que aconteceu em 2014.

A questão da receita fiscal é fulcral para a devolução da sobretaxa de IRS. Está prometida para 2016, relativa a 2015. Quanto é que vai ser preciso arrecadar a mais para devolver o dinheiro aos contribuintes?

De facto, criou-se um crédito fiscal na sobretaxa. Pela primeira vez na legislação portuguesa, fixou-se um limite a partir do qual o excedente de receita reverte directamente para o bolso dos contribuintes e não serve para financiar a despesa pública, nem para cobrir o défice orçamental. Vale para a sobretaxa em 2015, mas entendo que é um princípio virtuoso que devia valer para os outros impostos.

O Estado fixa um objectivo e até esse objectivo a receita fiscal é para cobrir as finanças públicas. A partir desse objectivo é para reembolsar os contribuintes. Para já, só funciona para a sobretaxa do IRS.

Se o crédito fiscal já estivesse em vigor em 2014, os contribuintes que pagaram a sobretaxa em 2014 receberiam o reembolso da totalidade da sobretaxa em Maio de 2015, quando entregassem a sua declaração de IRS. Porque as receitas do IVA e do IRS, as que contam para o crédito fiscal, superaram em cerca de 1.300 milhões de euros o objectivo de receita que estava estipulado para 2014.

Como a sobretaxa paga em 2014 andará à volta dos 730 milhões, por um lado, os contribuintes seriam totalmente reembolsados do pagamento da sobretaxa e, por outro, o Estado ainda ficava com 500 milhões de euros para financiar a despesa pública.

E o Estado não pode devolver já a sobretaxa?

Só está em vigor para 2015. Só posso dizer que é o objectivo de devolver a sobretaxa é um objectivo plausível, se voltarmos a superar receitas. Espero que em 2016 as pessoas possam receber total ou parcialmente a sobretaxa. Trabalharei todos os dias para que esse objectivo seja possível, mas só será possível se houver uma participação cívica de milhões de pessoas a pedirem factura.

Quando é que os contribuintes vão ter acesso à informação de quanto é que vão receber no próximo ano?

Hoje mesmo foi inaugurado um novo Portal das Finanças que tem um "site" especificamente só para o IRS. Será nesse site que as pessoas já vão poder ter acesso a todas as despesas dedutivas do novo IRS. Durante o segundo trimestre deste ano, as pessoas poderão começar a ter uma perspectiva de como está a evoluir a receita fiscal para efeitos de crédito fiscal da sobretaxa. Por uma questão de clareza, posso dizer que esse crédito fiscal só será apurado definitivamente a 31 de Dezembro de 2015 e só nessa altura se fará contas e se apurará o valor do reembolso. No fundo, os contribuintes podem ir acompanhando a evolução da receita no site, mas as contas finais apenas poderão ser feitas a 31 de Dezembro.

Os portugueses já pedem mais facturas?

Em 2014, 8 milhões e 400 mil portugueses pediram factura com número de contribuinte. É um número impressionante. Seria um número pouco provável há uns anos. As pessoas perceberam que o combate à fraude e evasão fiscal não é um exclusivo da administração fiscal, é um dever de cidadania.

Mas também há quem acuse o Governo de estar a transformar os contribuintes em fiscais.

Essa crítica faz pouco sentido. As pessoas têm simplesmente de pedir factura com número de contribuinte. O processo normal é: as empresas comunicam as facturas à administração fiscal e, posteriormente, a administração fiscal imputa as facturas na página pessoal de cada contribuinte, sem que as pessoas tenham de fazer mais nada.

Por que é que essa pergunta faz pouco sentido? Todos os trabalhadores por conta de outrem pagam os impostos até ao último cêntimo porque não têm hipótese nenhuma de escapar (e ainda bem que assim é). Não faz sentido que os deveres e as obrigações fiscais sejam só para uns. As regras têm de ser gerais e de se aplicar a todos os contribuintes.

Quando uma pessoa pede factura está a aplicar o princípio que todos estão a pagar os impostos de acordo com os seus reais rendimentos. Não faz sentido que sejam os trabalhadores por conta de outrem e os pensionistas a pagarem e depois haver outros contribuintes, utilizando esquemas e recorrendo a abusos, que não paguem. Quando se conseguir um alargamento da base e que haja mais contribuintes dentro do sistema, criam-se as condições para reduzir os impostos no futuro.

E o número de contribuinte é obrigatório para que a factura seja válida?

Esse é um elemento chave para o novo IRS. Todas as facturas têm de ser pedidas com NIF para que as pessoas possam beneficiar das deduções à colecta no IRS de 2015 a liquidar em 2016. As despesas, para serem consideradas em sede de IRS, têm de ter número de contribuinte

É preciso guardar as facturas em papel?

Não. O que as pessoas têm de fazer é pedir facturas com número de contribuinte. E, a partir daí, as empresas são obrigadas a comunicar electronicamente a factura à administração fiscal, que depois as imputa na página pessoal de cada contribuinte. Isso acontece um mês depois da emissão da factura porque as empresas apenas têm de as comunicar à administração fiscal até ao 25.º dia do mês seguinte. Facturas de Janeiro de 2015 terão de ser comunicadas até 25 de Fevereiro.

No momento em que tiverem a confirmação de que aquela despesa já se encontra na sua página pessoal do Portal das Finanças, podem rasgar a factura porque o crédito já está atribuído. Se, por uma razão excepcional, as empresas não comunicarem as facturas à administração fiscal, então os contribuintes são convidados a introduzir essas facturas no portal para poderem beneficiar das deduções à colecta em IRS.

Foram anunciadas 40 medidas de combate à evasão fiscal. Isso significa que até aqui o combate não funcionava? Ninguém verificava?

Não são 40, são mais de 100 medidas e há 40 que são prioritárias para 2015. Em termos sintéticos são as medidas têm em vista um maior controlo à emissão e facturas, dos inventários das empresas e do arrendamento clandestino. Esses controlos já existiam, mas são reforçados. Há um controlo mais apertado, um cruzamento de dados mais eficiente e um conjunto de automatismos que são criados. Se uma empresa for detectada a não comunicar as facturas está a prejudicar os contribuintes que deixam de poder deduzir a despesa em IRS e não está a cumprir as suas obrigações. Esta divergência é detectada automaticamente e há uma liquidação adicional relativamente ao imposto que não foi comunicado.

Lislei Santos faz uma pergunta em relação aos almoços dos filhos. As facturas dos almoços com o número de contribuintes das crianças também têm a dedução de 15% em sede de IRS, uma vez que os filhos estão a cargo?

Sim. Valem todas as despesas efectuadas por qualquer elemento da família.

Ainda no que toca aos filhos, António Cunha pergunta: para quando a funcionalidade que permita acompanhar a evolução das despesas dos dependentes no Portal das Finanças?

A partir de hoje as famílias podem aceder ao Portal das Finanças e ver todas as deduções à colecta. As despesas de saúde, habitação, etc..

Miguel Martins pergunta: em relação às despesas de educação, só são admitidas facturas emitidas por entidades com determinada CAE (Classificação de Actividades Económicas)?

As facturas de educação têm de ser emitidas por agentes económicos que possam exercer essa actividade. As empresas podem escolher os CAE que entenderam. As empresas têm CAE definidos e esse controlo é feito regularmente. O importante na educação é que, com o novo IRS, as famílias podem deduzir mais despesas. Também é criado o Vale Social de Educação, que pode ser atribuído pelas empresas aos seus funcionários e permite pagar despesas de educação dos filhos até aos 25 anos.

E se, por exemplo, um estudante comprar, pela internet, um livro no Reino Unido? Poderá deduzir essa despesa?

Pode. Nesse caso, em que as empresas estão fora e por isso não são obrigadas a comunicar facturas à administração fiscal, o contribuinte é convidado a incluir a factura no portal para poder beneficiar da dedução à colecta em IRS.

Um caso particular de um ouvinte: uma pessoa que está num processo de divórcio que se arrasta há dois anos. A guarda dos dependentes não está definida. As despesas vão para a declaração do IRS do pai ou da mãe? Ou os dois podem apresentar as respectivas despesas?

Quando há um divórcio e foi definida a guarda conjunta das crianças, há uma separação em metades iguais para os dois contribuintes. Isso funciona quer em termos de quociente familiar – é a grande medida da reforma do IRS para proteger as famílias com filhos, coisa que nunca tinha acontecido –, quer as despesas dos filhos são divididas em 50% para o pai e mãe. Enquanto a situação não é definida, continua a valer o regime do casamento.

Augusto Costa é funcionário público e teve a reposição dos 20% de vencimento, mas agora paga mais IRS e acaba por receber o mesmo ao nível do ordenado líquido. É um dos casos de subida de escalão?

São casos residuais. A partir do momento em que houve um aumento de rendimento, em casos de fronteira, pode acontecer. Mas também aconteceu ao contrário – quando houve uma redução nos salários para determinados funcionários, houve uma redução no IRS cobrado.

Anabela Vieira pergunta: em algumas facturas surge uma frase a dizer "Programa de facturação em processo de certificação". O que é que isto quer dizer?

Em princípio, aquela factura não deveria estar a ser emitida daquela forma. Só devem ser emitidas se os programas estiverem certificados. O contribuinte deve registar essa factura para a administração fiscal poder actuar junto da empresa que está a emitir facturas de uma forma que não está presente na lei.

Maria Palma pergunta: todos os meses, compro o passe nas máquinas do metro de Lisboa. A máquina não me permite inserir o NIF na factura. O que devo fazer para conseguir incluir essas despesas no meu IRS?

Deve incluir o documento que resulta dessas máquinas. Os contribuintes podem sempre pedir uma factura à empresa. Está-se a trabalhar para as máquinas possam emitir facturas.

Pedro Feliciano pergunta: o banco que credita mensalmente os cartões de refeição dos funcionários da empresa do Pedro emite uma nota de lançamento e não uma factura. É legal?

A questão é entre o banco e a empresa. A transacção terá necessariamente de ser objecto de factura.

Voltando ao quociente familiar. Os casais com filhos são beneficiados. E os que não tem filhos?

Os casais sem filhos não são prejudicados. O princípio fundamental que o Governo estabeleceu para esta reforma do IRS foi: as famílias com filhos passam a ter um tratamento fiscal claramente mais favorável, o que é inovador e da maior justiça. As famílias com filhos têm mais encargos e, por isso, merecem um tratamento fiscal mais favorável. Um milhão de famílias com filhos, que corresponde a cerca de 1 milhão e 800 mil contribuintes, vai pagar menos IRS em 2015

O sorteio dos automóveis vai continuar?

Essa medida provou ser acertada no combate à fraude e evasão fiscal. Determinou um aumento de 50% nas facturas com NIF. Vai continuar em 2015.

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