Das facturas de
transportes às despesas com filhos, do novo Portal das Finanças à devolução da
sobretaxa. A reforma do IRS, já em vigor, foi alvo de uma sessão de perguntas e
respostas com o secretário de Estado dos Assuntos Fiscais na Renascença.
O
secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Paulo Núncio, respondeu esta
segunda-feira às perguntas dos ouvintes e da Renascença sobre a reforma do IRS
e o ajuste nas tabelas de retenção. Em Janeiro, muitos portugueses já devem ter
sentido um aumento no vencimento líquido.
O ano passado correu bem ao Estado em termos fiscais. Arrecadou mais do que o esperado e para isto contribuiu o perdão fiscal. Este ano haverá novo plano para perdão fiscal?
Não.
No ano passado a receita fiscal superou todas as expectativas e deveu-se a dois
factores essenciais – por um lado, uma melhoria da actividade económica (há
mais emprego, houve mais transacções e isso reflecte-se no IRS, no IRC e no
IVA); por outro, houve um combate mais eficaz à fraude e evasão fiscal.
Significa que aqueles que se habituaram a não pagar os impostos devidos pagaram
mais impostos no ano passado. Isso determinou um aumento significativo da
receita.
No
ano passado não houve qualquer aumento de imposto nos três impostos mais
importantes (IRC, IVA e IRS) e, no entanto, a receita nos três impostos
aumentou. Há mais gente a descontar, há mais IRS cobrado e, por outro lado, há
mais consumo privado, mais IVA, mais IRC, e por isso a receita desses impostos
também aumenta. Isto significa que é possível, alargando a base, colocando mais
gente dentro do sistema, aumentar a receita fiscal sem aumentar os impostos.
Foi o que aconteceu em 2014.
A questão da
receita fiscal é fulcral para a devolução da sobretaxa de IRS. Está prometida
para 2016, relativa a 2015. Quanto é que vai ser preciso arrecadar a mais para
devolver o dinheiro aos contribuintes?
De
facto, criou-se um crédito fiscal na sobretaxa. Pela primeira vez na legislação
portuguesa, fixou-se um limite a partir do qual o excedente de receita reverte
directamente para o bolso dos contribuintes e não serve para financiar a
despesa pública, nem para cobrir o défice orçamental. Vale para a sobretaxa em
2015, mas entendo que é um princípio virtuoso que devia valer para os outros
impostos.
O
Estado fixa um objectivo e até esse objectivo a receita fiscal é para cobrir as
finanças públicas. A partir desse objectivo é para reembolsar os contribuintes.
Para já, só funciona para a sobretaxa do IRS.
Se
o crédito fiscal já estivesse em vigor em 2014, os contribuintes que pagaram a
sobretaxa em 2014 receberiam o reembolso da totalidade da sobretaxa em Maio de
2015, quando entregassem a sua declaração de IRS. Porque as receitas do IVA e
do IRS, as que contam para o crédito fiscal, superaram em cerca de 1.300
milhões de euros o objectivo de receita que estava estipulado para 2014.
Como
a sobretaxa paga em 2014 andará à volta dos 730 milhões, por um lado, os
contribuintes seriam totalmente reembolsados do pagamento da sobretaxa e, por
outro, o Estado ainda ficava com 500 milhões de euros para financiar a despesa
pública.
E o Estado não pode
devolver já a sobretaxa?
Só
está em vigor para 2015. Só posso dizer que é o objectivo de devolver a
sobretaxa é um objectivo plausível, se voltarmos a superar receitas. Espero que
em 2016 as pessoas possam receber total ou parcialmente a sobretaxa.
Trabalharei todos os dias para que esse objectivo seja possível, mas só será
possível se houver uma participação cívica de milhões de pessoas a pedirem
factura.
Quando é que os
contribuintes vão ter acesso à informação de quanto é que vão receber no
próximo ano?
Hoje
mesmo foi inaugurado um novo Portal das Finanças que tem um "site"
especificamente só para o IRS. Será nesse site que as pessoas já vão poder ter
acesso a todas as despesas dedutivas do novo IRS. Durante o segundo trimestre
deste ano, as pessoas poderão começar a ter uma perspectiva de como está a
evoluir a receita fiscal para efeitos de crédito fiscal da sobretaxa. Por uma
questão de clareza, posso dizer que esse crédito fiscal só será apurado
definitivamente a 31 de Dezembro de 2015 e só nessa altura se fará contas e se
apurará o valor do reembolso. No fundo, os contribuintes podem ir acompanhando
a evolução da receita no site, mas as contas finais apenas poderão ser feitas a
31 de Dezembro.
Os portugueses já
pedem mais facturas?
Em
2014, 8 milhões e 400 mil portugueses pediram factura com número de
contribuinte. É um número impressionante. Seria um número pouco provável há uns
anos. As pessoas perceberam que o combate à fraude e evasão fiscal não é um
exclusivo da administração fiscal, é um dever de cidadania.
Mas também há quem
acuse o Governo de estar a transformar os contribuintes em fiscais.
Essa
crítica faz pouco sentido. As pessoas têm simplesmente de pedir factura com
número de contribuinte. O processo normal é: as empresas comunicam as facturas
à administração fiscal e, posteriormente, a administração fiscal imputa as
facturas na página pessoal de cada contribuinte, sem que as pessoas tenham de
fazer mais nada.
Por
que é que essa pergunta faz pouco sentido? Todos os trabalhadores por conta de
outrem pagam os impostos até ao último cêntimo porque não têm hipótese nenhuma
de escapar (e ainda bem que assim é). Não faz sentido que os deveres e as
obrigações fiscais sejam só para uns. As regras têm de ser gerais e de se
aplicar a todos os contribuintes.
Quando
uma pessoa pede factura está a aplicar o princípio que todos estão a pagar os
impostos de acordo com os seus reais rendimentos. Não faz sentido que sejam os
trabalhadores por conta de outrem e os pensionistas a pagarem e depois haver
outros contribuintes, utilizando esquemas e recorrendo a abusos, que não
paguem. Quando se conseguir um alargamento da base e que haja mais
contribuintes dentro do sistema, criam-se as condições para reduzir os impostos
no futuro.
E o número de
contribuinte é obrigatório para que a factura seja válida?
Esse
é um elemento chave para o novo IRS. Todas as facturas têm de ser pedidas com
NIF para que as pessoas possam beneficiar das deduções à colecta no IRS de 2015
a liquidar em 2016. As despesas, para serem consideradas em sede de IRS, têm de
ter número de contribuinte
É preciso guardar
as facturas em papel?
Não.
O que as pessoas têm de fazer é pedir facturas com número de contribuinte. E, a
partir daí, as empresas são obrigadas a comunicar electronicamente a factura à
administração fiscal, que depois as imputa na página pessoal de cada
contribuinte. Isso acontece um mês depois da emissão da factura porque as
empresas apenas têm de as comunicar à administração fiscal até ao 25.º dia do
mês seguinte. Facturas de Janeiro de 2015 terão de ser comunicadas até 25 de
Fevereiro.
No
momento em que tiverem a confirmação de que aquela despesa já se encontra na
sua página pessoal do Portal das Finanças, podem rasgar a factura porque o
crédito já está atribuído. Se, por uma razão excepcional, as empresas não
comunicarem as facturas à administração fiscal, então os contribuintes são
convidados a introduzir essas facturas no portal para poderem beneficiar das
deduções à colecta em IRS.
Foram anunciadas 40
medidas de combate à evasão fiscal. Isso significa que até aqui o combate não
funcionava? Ninguém verificava?
Não
são 40, são mais de 100 medidas e há 40 que são prioritárias para 2015. Em
termos sintéticos são as medidas têm em vista um maior controlo à emissão e
facturas, dos inventários das empresas e do arrendamento clandestino. Esses
controlos já existiam, mas são reforçados. Há um controlo mais apertado, um
cruzamento de dados mais eficiente e um conjunto de automatismos que são
criados. Se uma empresa for detectada a não comunicar as facturas está a
prejudicar os contribuintes que deixam de poder deduzir a despesa em IRS e não
está a cumprir as suas obrigações. Esta divergência é detectada automaticamente
e há uma liquidação adicional relativamente ao imposto que não foi comunicado.
Lislei Santos faz
uma pergunta em relação aos almoços dos filhos. As facturas dos almoços com o
número de contribuintes das crianças também têm a dedução de 15% em sede de
IRS, uma vez que os filhos estão a cargo?
Sim.
Valem todas as despesas efectuadas por qualquer elemento da família.
Ainda no que toca
aos filhos, António Cunha pergunta: para quando a funcionalidade que permita
acompanhar a evolução das despesas dos dependentes no Portal das Finanças?
A
partir de hoje as famílias podem aceder ao Portal das Finanças e ver todas as
deduções à colecta. As despesas de saúde, habitação, etc..
Miguel Martins
pergunta: em relação às despesas de educação, só são admitidas facturas
emitidas por entidades com determinada CAE (Classificação de Actividades
Económicas)?
As
facturas de educação têm de ser emitidas por agentes económicos que possam
exercer essa actividade. As empresas podem escolher os CAE que entenderam. As
empresas têm CAE definidos e esse controlo é feito regularmente. O importante
na educação é que, com o novo IRS, as famílias podem deduzir mais despesas.
Também é criado o Vale Social de Educação, que pode ser atribuído pelas
empresas aos seus funcionários e permite pagar despesas de educação dos filhos
até aos 25 anos.
E se, por exemplo,
um estudante comprar, pela internet, um livro no Reino Unido? Poderá deduzir
essa despesa?
Pode.
Nesse caso, em que as empresas estão fora e por isso não são obrigadas a
comunicar facturas à administração fiscal, o contribuinte é convidado a incluir
a factura no portal para poder beneficiar da dedução à colecta em IRS.
Um caso particular
de um ouvinte: uma pessoa que está num processo de divórcio que se arrasta há
dois anos. A guarda dos dependentes não está definida. As despesas vão para a
declaração do IRS do pai ou da mãe? Ou os dois podem apresentar as respectivas
despesas?
Quando
há um divórcio e foi definida a guarda conjunta das crianças, há uma separação
em metades iguais para os dois contribuintes. Isso funciona quer em termos de
quociente familiar – é a grande medida da reforma do IRS para proteger as
famílias com filhos, coisa que nunca tinha acontecido –, quer as despesas dos
filhos são divididas em 50% para o pai e mãe. Enquanto a situação não é
definida, continua a valer o regime do casamento.
Augusto Costa é
funcionário público e teve a reposição dos 20% de vencimento, mas agora paga
mais IRS e acaba por receber o mesmo ao nível do ordenado líquido. É um dos
casos de subida de escalão?
São
casos residuais. A partir do momento em que houve um aumento de rendimento, em
casos de fronteira, pode acontecer. Mas também aconteceu ao contrário – quando
houve uma redução nos salários para determinados funcionários, houve uma
redução no IRS cobrado.
Anabela Vieira
pergunta: em algumas facturas surge uma frase a dizer "Programa de facturação
em processo de certificação". O que é que isto quer dizer?
Em
princípio, aquela factura não deveria estar a ser emitida daquela forma. Só
devem ser emitidas se os programas estiverem certificados. O contribuinte deve
registar essa factura para a administração fiscal poder actuar junto da empresa
que está a emitir facturas de uma forma que não está presente na lei.
Maria Palma
pergunta: todos os meses, compro o passe nas máquinas do metro de Lisboa. A
máquina não me permite inserir o NIF na factura. O que devo fazer para
conseguir incluir essas despesas no meu IRS?
Deve
incluir o documento que resulta dessas máquinas. Os contribuintes podem sempre
pedir uma factura à empresa. Está-se a trabalhar para as máquinas possam emitir
facturas.
Pedro Feliciano
pergunta: o banco que credita mensalmente os cartões de refeição dos
funcionários da empresa do Pedro emite uma nota de lançamento e não uma
factura. É legal?
A
questão é entre o banco e a empresa. A transacção terá necessariamente de ser objecto
de factura.
Voltando ao
quociente familiar. Os casais com filhos são beneficiados. E os que não tem
filhos?
Os
casais sem filhos não são prejudicados. O princípio fundamental que o Governo
estabeleceu para esta reforma do IRS foi: as famílias com filhos passam a ter
um tratamento fiscal claramente mais favorável, o que é inovador e da maior
justiça. As famílias com filhos têm mais encargos e, por isso, merecem um
tratamento fiscal mais favorável. Um milhão de famílias com filhos, que
corresponde a cerca de 1 milhão e 800 mil contribuintes, vai pagar menos IRS em
2015
O sorteio dos
automóveis vai continuar?
Essa
medida provou ser acertada no combate à fraude e evasão fiscal. Determinou um
aumento de 50% nas facturas com NIF. Vai continuar em 2015.
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