No
início do mês de Junho nas manhãs de quando em vez fomos contemplados com
ligeiros orvalhos aos quais designo por tempo de caracol.
Um
dia destes deixaram-me eles uma mensagem indecifrável no pavimento cimentado do
logradouro da casa que habito, um flash de memória recordou-me que Sto António
anda por ai S. João e S. Pedro estão a chegar ao coração dos seus devotos. Que
ingénua foi a geração dos anos trinta e outras paralelas “os corações
transbordavam fé e amor p’los Stos Populares”. A moça com idade casadoira que
não queria ficar para tia nas suas rezas pedia ao Sto António – Ó bondoso Sto
António – meu Sto casamenteiro – dá-me um homem trajadinho – que tenha muito
dinheiro. Dependurava a moça a imagem do Sto de cabeça para baixo crente que
alguém iria perder a cabeça por ela de sonhos temos as mãos cheias. Era usual
querer-mos saber o que a sorte nos reservava utilizando pequenos papeis com
algo escrito relacionado com namorico sucesso nos exames escolares ou liceal
etc etc, estes papéis eram enrolados e depois deixados ao relento da noite,
aprisionava-se um caracol de’baixo de um cesto de vimes ou alguidar de barro
tudo isto na mágica noite que antecede ao dia consagrado ao Sto e logo de manhã
cheios de entusiasmo curiosos íamos ver qual o papel aberto ou a letra desenho
do rastejo do caracol se nos dizia algo ou não.
Outras
sortes eram feitas num recipiente com água e uma clara de ovo, que por vezes
fazem figuras interessantes exemplificando um barco, viagem, igreja o casamento
etc etc. Era um grande bem para as populações das nossas freguesias; os
fontenários; raros eram, aqueles que possuíam água canalizada em suas casas. Na
casa de meus pais não tivemos este privilégio com exactidão, não sei dizer
quantas vezes fui buscar água ao fontenário com um pequeno talhão de barro e
que fresca que era a água que se bebia. Há que recordar o cuidado no asseio dos
nossos fontenários nas vésperas dos Stos Populares, decorávamos as paredes e
recinto com rosas novelões e ramos de cedro manjericos incenses e outras
plantas aromáticas. Antes do sol nascer ia-se buscar água à fonte que dizíamos
ser benta que nos livrava de doença e “mau olhado”. Do coração sedento –
soltou-se sonhos loucos desejos – Encharquei-me de beijos – Na fonte da vida.
Nos
dias que antecedia a comemoração dos Stos populares ia-se as matas apanhar
ramada na sua maioria seca juntava-se alguma verde “perfumada” incensos urzes e
louros e fazíamos fogueiras.
Por
cima das chamas davam-se loucos saltos seguidamente formava-se roda e de mãos
dadas dançávamos cantando, que bonito que era corações e mãos dadas. Éramos
irmãos na alegria partilhada! À roda de uma fogueira – Gira que gira a cantar –
Um beijo por brincadeira – Ao meu amor quero dar.
Assim
acontecia uma vez ou outra de fugida os namorados eram mais atrevidos e davam
um beijo. Se os pais viam “fechavam os olhos” porque era noite de Sto António
ou de S. João pulsava o coração havia animação – é festa diziam eles.
É
louvável que festejamos com fé os Stos populares que sempre estarão no coração
crente da nossa gente, falar dos Stos é juntar uma ou outra quadra para manter
a tradição.
Aos
Stos não prometas – Se não podes cumprir – Promessas não são tretas – Saibas
viver sem mentir. – A chama do teu olhar – Incendeia o meu rosto – Coração
louco vou-te amar – Entre Junho e Agosto.
Arremato
fantasiado – No cerrado ondulado do mar ovelhas brancas do S. João da Vila
estão pastando, surgem lobos marinhos amedronta-os o Deus Neptuno com o
tridente. Na escarpa do medo no arrebol do sonho loucas sereias com arcos e
balões saltam fogueiras de lava incandescente fascinadas por fumarolas de
incenso abissal da natureza senhora da vida.
Benjamim
Carmo
Sem comentários:
Enviar um comentário