Hoje venho até ao cemitério das Furnas render-te homenagem avó. Faz hoje 50 anos sobre o 25 de Abril, o único dia que me lembro de teres vertido uma lágrima.
Na tua campa nem um único cravo chegou, nem da junta, nem da câmara, nem do governo, nenhum mesmo, nem vermelho nem de cor alguma, contudo foste um dos poucos, para não dizer o único filho deste vulcão, que não tiveste medo de falar e por isso foste preso. Tu que chegaste a dividir uma banana por cinco partes iguais para que todos na mesa de jantar lá de casa acreditassem que não estavam a passar fome!
Só os teus sempre fiéis músicos militares não se esqueceram de ti, a nossa Banda Militar (a dos Açores) tocou ontem à noite no Auditório Camões a tua bela suite de valsas, Rosas de Maio, quanto aos restantes nem uma palavra. Uma tristeza!
O filho do Senhor Furtado, o nosso vizinho, o que foi para Lisboa tirar um curso, o Gualter, lembras-te avo, aquele que tanto gostavas, foi o único que tudo fez para que não fosses esquecido hoje.
Sabes avo os democratas agora são eles todos, são milhões deles, aparecem como coelhos de todos os cantos com cravos falsos, todos escrevem livros, todos eles inventam histórias e historietas, uns porque tiveram a ideia de por um cravo na ponta de uma espingarda tem direito a telejornal, outros por outras tantas menores razões que nem lembra ao diabo, tiveram lindas condecorações, palavras, e insígnias lindíssimas da nossa República Portuguesa, mas os poucos como tu, os verdadeiros democratas não constaram de nenhuma lista, não tiveram artigos nos jornais, nem receberam homenagens públicas, nem aparecem em coisa alguma. Todos estão felizes agora, o país coloriu-se de belas cores, vocês os verdadeiros democratas, apenas jazem nas vossas pobres covas esquecidos e humilhados, curiosamente, nem melhor nem pior, tal qual o ditador que lá no Vimieiro jaz também esquecido e humilhado como vocês. A tua luta não serviu para ti nem para os teus, se soubesses o que estão fazendo comigo neste preciso momento, acho que até é melhor nem contar-te calar-me para que possas continuar a descansar em Paz. Avô arranjei a campa, consegui por-vos todos juntos, só falta o Paulo por estar ainda impedido. Recebe um beijo deste teu neto que te admira e te ama muito! Luís Miguel.
PS: Vou falar nestes próximos dias com o Regente da Banda Militar a pedir que ponha a tocar a tua marcha “NA PRISÃO” a tal música que compuseste imaginando o teu próprio funeral e que eu não conheço ainda. E agora despeço-me vou até a casa!
(Texto escrito no interior do Cemitério de Santana das Furnas)
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