Os atractivos das Furnas são diversos. Desde as fumarolas onde
se cozinha o famoso cozido, às diferentes nascentes de água que os turistas
gostam de provar, ao Parque Terra Nostra que foi considerado um dos mais
bonitos do mundo pela revista da especialidade Condé Nast, ao Spa a céu aberto
que é a Poça da Dona Beija, passando pelos tradicionais bolos lêvedos, são
muitas as razões para visitar as Furnas.
Quem ali mora diz que vir a São Miguel e não visitar as Furnas
“é como ir a Roma e não ver o Papa”, como diz o ditado. E com a liberalização
do espaço aéreo e a vinda de companhias aéreas de baixo custo, toda a economia
regional tem aumentado e as Furnas não são excepção.
No Verão quase que este aumento não pode ser contabilizado, uma
vez que é na época alta que a freguesia do concelho da Povoação se enche mais
de turistas. Mas depois de começar o ano escolar era notório um grande
decréscimo na procura das Furnas, mas com os voos a baixo custo, empresários e
comerciantes garantem que o fluxo de turismo se mantém constante, mesmo depois
do início de Setembro quando geralmente arranca o ano escolar e as viagens em
família ficam para outras alturas.
Os turistas gostam de visitar as caldeiras, mesmo junto à lagoa,
e nem o pacote de taxas que foi implementado a 1 de Março de 2015, os impede de
ver como é que o interior da terra consegue cozinhar como se de um fogão se
tratasse. A maior parte dos turistas aceita o pagamento da entrada, embora
considere que é uma sobreposição depois também o pagamento do estacionamento,
mesmo junto à lagoa. Quanto à cobrança para serem usadas as covas onde são
feitos os cozidos, os turistas confessam não terem opinião já que como estão de
visita não fazem uso das covas, mas acreditam ser uma forma de controlar o
espaço que, dizem, deve ser mantido.
A Igreja de Nossa Senhora das Vitórias, na margem Sul da lagoa,
também chama a atenção dos turistas. O estilo neogótico encanta quem quer ver
de perto, e até quem consegue uma visita guiada à ermida particular. A história
de amor por detrás do Imóvel de Interesse Público, ainda reforça mais a beleza
da ermida que fica envolta num cenário edílico com a lagoa em frente e a
luxuriante mata-jardim José do Canto por detrás.
Já no centro da freguesia, os turistas gostam de tirar
fotografias junto às caldeiras de enxofre e são aconselhados a provar as
diferentes nascentes de água que ali se encontram à disposição. Ficam também
entusiasmados quando se deparam com as maçarocas de milho cozidas na caldeira e
que depois são vendidas a quem as quer provar.
Mas é o verde luxuriante dos parques e jardins das Furnas que
deixa os turistas de boca aberta. Alguns jardins são privados e outros apenas
são visitáveis durante o mês de Agosto, mas é o Parque Terra Nostra com o seu
tanque de água férrea e termal, a imponente Casa do Parque que foi residência
de Verão do fundador Thomas Hickling e os jardins com várias espécies exóticas,
que mais deslumbra os turistas.
Quem opta por não entrar no Parque Terra Nostra, decide-se
geralmente por visitar a Poça da Dona Beija, outro dos ex-libris das Furnas. As
águas quentes, com piscinas renovadas mesmo junto a uma ribeira com água
férrea, estão abertas até às 23 horas proporcionando horas de relaxamento a
quem nunca experimentou nascentes de água quente.
Sendo as Furnas um local turístico por natureza, é normal que os
restaurantes tenham sentido também um aumento no número de refeições servidas
durante o Verão, mas a grande questão era o Inverno que, por enquanto tem
conseguido elevar as expectativas dos empresários.
Restaurantes têm boa procura
mas querem mais investimento
O cozido das caldeiras das Furnas é considerado uma iguaria e
talvez por isso seja o prato mais procurado por quem visita as Furnas.
No restaurante Tony’s trabalham actualmente 23 funcionários e o
proprietário, António Arruda, afirma que 90% sabe falar inglês. Um requisito
talvez mais importante do que a experiência que muitos adquiriram no Hotel
Terra Nostra quando lá trabalharam. “Temos uma equipa de altíssimo nível e
queria era que toda a gente falasse inglês para ter um bom atendimento ao nosso
cliente, para que fique satisfeito e leve boas recordações do restaurante e dos
Açores”, explica o proprietário.
António Arruda confirma que “a partir do momento em que as
companhias low cost começaram a viajar para cá, notou-se logo um aumento de
movimento” e refere que este ano foi “muitíssimo bom” para o restaurante tal
como já tinha acontecido no ano passado. Quando se lhe perguntam percentagens
desses aumentos, não hesita em apontar aumentos de 80% “ou mais”, quando
comparado com anos anteriores. “Na época de Verão disparou totalmente”, conta.
“Dizia que antes de virem as low cost, na época de Verão
tínhamos um movimento razoável mesmo com as pessoas que vinham passar o Verão
às Furnas, com os nossos emigrantes e depois caía a pique a partir da abertura
das escolas”, no entanto actualmente os almoços ainda garantem casa cheia nas
duas grandes salas do restaurante.
Para tentar ilustrar o aumento da procura que se tem verificado
no restaurante António Arruda, que se mantém no Tony’s desde 1984, recorda os
primeiros tempos em que abriu portas. “Sou do tempo em que só fazia uma
panelinha de cozido quando tinha cinco pessoas para comer cozido, tinha dias
seguidos que não havia ninguém para comer, hoje em dia não se pode abrir a
porta sem ter cozido”, conta.
Agora até tem de abrir “a segunda rodada” de mesas a partir das
14h para conseguir dar resposta a todos os que o procuram. É que, como aponta
António Arruda, uma das “bases fundamentais” para que as Furnas sejam tão
visitadas além da luxuriante natureza é a “localização estratégica”. Ou seja,
“as Furnas ficam num ponto estratégico para que o turista possa chegar aqui à
hora de almoço. O espaço que há desde a saída de Ponta Delgada, que é o ponto
de concentração maior de turistas, até às Furnas que vai parando nos
miradouros, fábricas de chá ou fábricas de cerâmica, chega cá quase na hora
exacta do almoço. Se as Furnas ficassem em São Roque ou um bocado mais desviado
como Água Retorta, talvez não tivessem o movimento que tem porque não se
chegava à hora de almoço”, refere.
António Arruda diz que apesar das Furnas serem quase como um
cartão de visita dos Açores e um ponto de paragem obrigatória, “podia-se e
pode-se melhorar”. O empresário diz que há pequenas coisas que se poderia fazer
e “não é preciso andar com muitos gastos, mas talvez a Câmara da Povoação não
tenha suporte financeiro”, comenta.
Uma das coisas a melhorar é o estacionamento dentro da
freguesia, já que “durante o Verão há um movimento fora do normal, de viaturas
e pessoas, e não há parques de estacionamento suficientes”.
Além disso, a pouca iluminação durante a noite e a falta de
papeleiras pela freguesia são também pontos a melhorar mas são as taxas
cobradas na entrada das caldeiras que António Arruda que têm de ser melhoradas.
Não porque não concorde com elas porque “sou plenamente de acordo que se pague
a entrada”, no entanto acredita que com essa fonte de receita deveriam ser
melhoradas as condições para quem visita.
“Qualquer pessoa que entre aqui no restaurante, me dê dinheiro
não se pode ir embora sem comer. Temos de ter algo para dar em troca, temos de
ter algo para lhe dar para que pague e vá embora satisfeito”, refere ao
acrescentar que no caso das lagoas “fez-se uma portagem, mas não se criaram
condições”. Dá o exemplo de quem até pagou para fazer um piquenique em família
mas que “se quiser lavar as mãos ou um garfo que caiu no chão” só tem águas nas
casas de banho “que não estão muito boas”, lamenta.
Da mesma opinião é Rui Vasco Ferreira, do restaurante Miroma,
que considera que o pagamento das taxas até pelos restaurantes representa um
custo para os empresários que não viram melhorados os locais onde deixam as
panelas.
Rui Vasco Ferreira diz que o local, com a chuva dos últimos
dias, “fica um lameiro e nem um bocadinho de cascalho se mete no chão”. E nem
os funcionários que recebem agora as panelas estão devidamente protegidos para
o trabalho que exercem, “nem uma roupa de água para estes dias de chuva eles
têm”, alerta o filho do proprietário do Miroma que acrescenta que “tem de se
investir nessas coisas”.
No entanto, ressalva que o pagamento de taxas por parte dos
restaurantes até é “uma segurança” porque ao contrário do que acontecia
antigamente “agora chegamos lá e está tudo certinho, ninguém mexe nas covas o
que não acontecia anteriormente porque só começavam a tomar conta dos cozidos a
partir das 6 da manhã. Agora estão toda a noite lá. Quem mete as panelas mais
cedo tem a segurança que ninguém mexe ali”.
Rui Vasco Ferreira diz que assim há forma de garantir que todos
os turistas que fazem reserva para o cozido são bem servidos e que há a afamada
comida para todos. Até porque os aumentos rondam os 90% “ou mais” agora que se
iniciou a época baixa. “O Verão era sempre bom, mas agora é todo o ano. Temos
mais pessoas no Verão mas no Inverno, principalmente quando começavam as aulas,
notávamos uma quebra muito grande. Agora não, continua”, refere.
E não são só os estrangeiros que procuram o Miroma, também os
turistas nacionais aparecem em grande número e os micaelenses também procuram o
cozido das Furnas. A procura levou à necessidade de aumentar o pessoal que
actualmente são 14 pessoas mas dentro de pouco tempo deverão ser contratadas
mais duas pessoas para que quem trabalhou todo o Verão possa ter as merecidas
férias.
Rui Vasco Ferreira espera que o fluxo de turistas continue a
aumentar já que é deles que vive maioritariamente o negócio. Mas ressalva que
agora que o Governo Regional apostou na abertura do espaço aéreo “os nossos
presidentes locais também têm de fazer por isso. Junta de Freguesia e Câmara
Municipal da Povoação também têm de investir mais nas Furnas”, alerta.
Bolos lêvedos “perderam”
mercado das famílias que se juntavam na lagoa
Se os turistas procuram cada vez mais os restaurantes para
comerem o tradicional cozido nas caldeiras, outra das iguarias das Furnas, os
bolos lêvedos, não tem tido mais procura do que a habitual. Aliás, o empresário
Luís Quental, da empresa Rosa Quental, diz que o pagamento de taxas na lagoa
tem evitado que as famílias micaelenses se dirijam às Furnas para se juntarem
como antigamente para fazer piqueniques.
Por isso, apesar de reconhecer que “o impacto das low cost na
nossa economia foi inegável”, refere que “no nosso sector em concreto, o
impacto positivo que reconhecemos, acabou por não ter grande influência no
crescimento porque perdemos um mercado que para nós era muito importante, que
era o mercado dos cozidos da Lagoa das Furnas. As inúmeras famílias e grupos
que vinham fazer cozidos para a lagoa tinham uma importância muito
significativa na freguesia. O quase certo aumento de produção que podíamos ter
tido com as low cost foi dissolvido nessa perda. Uma coisa compensou a outra
mas ficámos a perder porque podíamos ter ganho mais, podíamos empregar mais
pessoas e dinamizar mais a economia e isso não se verificou, justamente por
causa do efeito das taxas na lagoa das Furnas”, refere o empresário que foi um
dos acérrimos opositores à introdução das taxas na lagoa.
Luís Quental, que é também Presidente da Associação Empresarial
das Furnas, explica que há sectores, como o alojamento, as empresas de aluguer
de automóveis e a restauração que foram mais dinamizados com o impacto das
companhias low cost. Já o negócio das famílias micaelenses que, provavelmente
em vez de levarem um bolo lêvedo compravam duas ou três embalagens, teve um
decréscimo. “Naturalmente que a criação daquele pacote de taxas não afectou
tanto a hotelaria nem a restauração, por causa do impacto muito positivo das low
cost, porque essas pessoas residentes não utilizavam o alojamento. As low cost
beneficiaram muito a economia, mas nos sectores que viviam muito dos
residentes, o efeito positivo que teve foi engolido pela perda desse nicho de
mercado que era muito importante”, reforça.
A empresa Rosa Quental está vocacionada para a venda directa ao
público, faz distribuição a clientes institucionais e tem uma “componente muito
forte de exportação”, que foi a forma encontrada para colmatar as dificuldades
dos últimos anos quando a crise se abateu na economia regional e nacional.
“Tivemos de fazer isso para manter os níveis de produção”, conta Luís Quental.
Mas o empresário diz que apesar das Furnas serem quase uma
paragem obrigatória para os turistas onde “só os fenómenos vulcânicos e a nossa
paisagem vão fazendo com que os turistas venham cá, porque muito pouco do que o
homem tem feito tem contribuído para essas visitas”.
O Presidente da Associação Empresarial diz que é sempre possível
fazer mais e lamenta que “as Furnas sempre tiveram um défice de investimento,
seja público seja privado, aliás o investimento privado é que tem tido sempre
mais expressão na localidade o que é de alguma forma incompreensível porque
sendo receptora de um volume grande de turismo não haja o cuidado que devia
existir”. Quando fala em cuidados refere-se, por exemplo, ao nível da
manutenção de algumas estruturas, de limpeza, embelezamento e “da formação que
é necessária para se dar uma boa imagem dos Açores. Temos muito património
degradado, não temos qualquer tipo de programação cultural ao longo do ano, não
temos roteiros e temos imensas potencialidades nesse sentido, quer ao nível do
termalismo quer da arqueologia industrial de indústrias antigas que existiam
aqui”.
Estruturas “que se foram arruinando” e que não estão a ser
devidamente recuperadas para serem outra mais-valia que a freguesia pudesse
apresentar aos turistas.
Também noutra empresa que confecciona os tradicionais bolos
lêvedos o ano tem sido bom. O pão doce que ganhou relevo comercial com a
abertura nos anos 30 do Hotel Terra Nostra, que ainda hoje continua a servi-lo
ao pequeno-almoço, tem tido bastante procura com a entrada das companhias de
baixo custo na região. Hélder Moniz, filho da proprietária, refere que o
aumento nas vendas é mais notório na época alta com excepção “dos fins de
semana em que se nota um maior fluxo de turismo e mesmo de residentes”.
Hélder Moniz reconhece o aumento mas “no nosso ramo não houve
uma diferença exponencial” já que a maior fatia da produção de bolos lêvedos da
empresa segue para supermercados que “também não aumentaram muito os pedidos”.
“Temos tido uma boa produção” e constante, refere Hélder Moniz.
Como forma de rentabilizar ainda mais o produto, a empresa de Glória Moniz
apresenta agora uma novidade ao cliente: os croutons de bolo lêvedo. É um
produto recente que, Hélder Moniz comenta que ainda não foi muito divulgado e
por isso as pessoas ainda não têm conhecimento. Só quem se dirige à padaria de
Glória Moniz é que tem conhecimento deste novo produto para enriquecer pratos,
por exemplo de saladas. O teste está agora a ser feito para descobrir de vale a
pena apostar na comercialização nas lojas onde a empresa faz a distribuição.
Nesta altura, entra um casal de turistas pela propriedade de Glória
Moniz para satisfazer a curiosidade acerca dos bolos lêvedos. Dizem que já
passearam pelo centro das Furnas e antes do almoço querem provar aquela
iguaria. O casal diz que já visitou a lagoa mas como foi avisado no hotel, em
Ponta Delgada, que necessitariam de pagar a taxa de entrada para visitar as
caldeiras e também o estacionamento no parque, optaram por estacionar o carro
na berma da estrada regional e contemplar a tranquila paisagem dali mesmo,
seguindo depois para o centro da freguesia onde puderam ver as fumarolas mais
de perto.
Apesar de não haver números sobre as entradas na lagoa das
Furnas, que deverão ser apresentadas pela Câmara Municipal da Povoação só no
final do ano, certo é que alguns turistas têm optado por estacionar os carros
de aluguer no parque de estacionamento logo à entrada da lagoa e percorrer a pé
o caminho que passa pela Igreja de Nossa Senhora das Vitórias, e avistar as
caldeiras do lado contrário. Mas muitos deles optam por estacionar na berma da
estrada regional, por vezes causando constrangimentos ao trânsito, para
contemplar a paisagem, fotografar e seguir viagem em direcção ao centro da
freguesia.
Escrito por:
Carla Dias
Fonte:
Jornal Correio dos Açores
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