Esta
é uma história que infelizmente terminou de forma trágica e que Um Olhar Povoacense vai dar a conhecer aos seus seguidores. Uma história que já conta
com 38 anos e que envolve uma família da Povoação.
Achamos
que apesar do triste destino desta nossa irmã povoacense, esta, não deve ser
esquecida e devemos orgulhar-nos do seu curto percurso de vida, afinal era uma
de nós, uma rapariga que adorava a sua terra e que até num determinado momento
pediu aos seus pais para ficar atrás, com os seus padrinhos de batismo.
A
história que hoje vamos dar-vos a conhecer é um relato da altura dos
acontecimentos, uma tradução do Inglês para o Português e que apenas procedemos
a algumas correções, mantendo o conteúdo tal como foi relatado pela imprensa
Bermudense. Também apresentamos algumas fotos atuais da sua sepultura no
cemitério de São João na Lomba do Loução e da casa ofertada pelos amigos da
Bermuda à sua família (L. Loução) depois do trágico acontecimento e regresso à
Povoação.
Maria da Conceição Costa Furtado (Sãozinha) nasceu a 8 de Novembro de 1966 na Vila da Povoação, filha
de Daniel Raposo Furtado e de Cesaltina da Costa (já falecida), moravam no
Morro.
O
seu pai, Daniel Furtado, como tantos outros micaelenses foi à procura de uma
melhor condição de vida para a sua família, emigrando para a Bermuda, contratado
para serviço de hotel. Partiu rumo ao território britânico ultramarino a 15 de
Janeiro de 1969, com contrato pelo cônsul de então, Filipe Macedo.
A
mulher de Daniel Furtado, Cesaltina, ficara na Vila da Povoação com a sua filha
mais velha “Sãozinha” e o seu filho mais novo Paulo Furtado, mas a 5 de
Dezembro de 1971 partiu rumo à Bermuda para se juntar ao seu marido e pai dos
seus queridos filhos. Tinha então a Sãozinha 5 anos de idade e o seu mano Paulo
2 anos. Chegados à Bermuda a Sãozinha entrou de imediato para a escola e para a
catequese, sendo de salientar a fácil integração da jovem povoacense na
comunidade bermudense e a sua dedicação aos estudos e catequese, uma ótima
aluna, assim a classificavam.
No
ano de 1972 a jovem povoacense fez a sua Primeira Comunhão na Igreja de Santo
António, no WarWick, sendo um momento de profunda emoção e alegria para ela e
sua família.
Entretanto,
fruto do amor que unia Daniel e Cesaltina dá-se o nascimento de mais um rebento,
agora na Bermuda, mais um irmãozinho, o Maximino, apesar das dificuldades da
vida e dos obstáculos do dia-a-dia para manter a família na Bermuda. A pobreza
nunca foi vergonha para ninguém e manter a família unida era o mais importante
para este chefe de família povoacense.
E
a Sãozinha já era uma aluna da terceira classe da escola bermudense e na
catequese era classificada com Excelente.
Maximino
nasceu a 28 de Março de 1973 e foi batizado na Catedral de Santa Teresa a
22/04/1973. E a partir desse momento são os pais e três filhinhos na Bermuda.
No
ano de 1974, a 24 de outubro, Cesaltina e os seus três filhos regressam à ilha
de São Miguel, Vila da Povoação.
A Sãozinha |
Foram
grandes as despesas para o povoacense Daniel, mas a família voltara à Bermuda,
desembarcando a 10 de Setembro de 1977. Assim regressava Cesaltina com os três
grandes amores de 11, 8 e 4 anos de idade.
Chegados
de novo à Bermuda, Sãozinha e o seu irmão Paulo começam de imediato a
frequentar a escola e a catequese. A Sãozinha era já uma mulherzinha, muito
educada, nunca faltava à escola nem à catequese, era assídua e pontual.
A
mãe estranhava a sua piedade e recanto. Todos os dias junto ao sofá onde dormia,
por falta de quartos, Sãozinha rezava de joelhos. Recatada, não queria que a
sua mãe entrasse no seu dormitório ou no quarto de banho sem estar devidamente
composta. Ela mesma tratava com esmero as suas roupinhas e escolhia aquelas que
devia de vestir.
Na
escola os professores estavam admirados de como Sãozinha não esquecera nada do
seu inglês, enquanto estivera de regresso à sua terra natal, Vila da Povoação,
e, em poucos meses, já tinha ela alcançado a 6ª classe na Bermuda.
Dia 22 de Fevereiro de 1978!
Como
de costume a Sãozinha e o mano Paulo foram para a escola a pé, uns bons centos
de metros de sua casa. No regresso das aulas era costume o seu irmão acompanhar
alguns colegas rapazes e ela meninas. O
irmão chegou a casa pelas horas do costume, 4 horas da tarde, mas a Sãozinha
não apareceu. A mãe não se preocupou porque ela no regresso da escola costumava
parar em casa de famílias portuguesas conhecidas e amigas.
A
noite aproximava-se e nada de Sãozinha regressar a casa. Sua mãe ficou com o
coração apertado e muito preocupada, foi desesperadamente à procura da filha,
perguntou pela “sua rapariga” aos vizinhos e amigos. Recebeu como resposta “ela
hoje não passou por aqui”.
O
pai de Sãozinha estava no trabalho sem saber o que se passava. A noite entra e a
vizinhança e os amigos empunhando lanternas na mão procuram-na
desesperadamente. Aproxima-se a meia-noite e é então comunicado à Polícia o
sucedido. Esta coloca-se de imediato em campo à procura da jovem emigrante povoacense
desaparecida. A noite encontrava-se frígida e chovia. No dia seguinte a rádio
pedia auxílio continuadamente para a busca e na televisão era mostrada a sua
fotografia. A tropa foi chamada a auxiliar a Polícia.
QUATRO HORAS E VINTE DA TARDE!
A
poucas centenas de metros da sua casa aparece morta, esta inocente criança,
vítima da sua pureza. Mãos assassinas violaram-na e depois mataram-na!
Pelas
seis horas da tarde a televisão local dá a notícia com a fotografia da
Sãozinha, e dá a conhecer o terrível crime, toda a Bermuda ficou chocada com
tamanha selvajaria. Nunca na história da Bermuda se viu um crime deste. Tudo
aquilo que se passou, não há palavras que o descreva. As autoridades, desde o
Sr. Governador, manifestaram a sua repulsa e visitaram a família açoriana.
Quando
souberam das dificuldades económicas desta família e a desgraça que se abatera
sobre ela, os auxílios apareceram de todos os lados.
No
meio de tanta infelicidade a mesma acabou por trazer um pouquinho de
felicidade. Mas o que se desejava era que esta tragédia nunca tivesse
acontecido.
Depois
das formalidades legais, o corpo da virgem mártir seguiu para a morgue do
hospital para ser autopsiada. Do corpo da jovem povoacense foram retiradas
várias amostras para análises que foram enviadas para um laboratório de
Londres, a fim de ver se era possível a descoberta das mãos criminosas. Afinal
acabou por não ser necessário. No dia do funeral, o criminoso foi preso. Vinte
e sete anos de idade! O assassino não era Português. Foi assim divulgada a
notícia da prisão, o povo reuniu-se à volta do Tribunal onde foi proclamado o
crime e presente o criminoso. A Polícia teve de conter a multidão para que o
criminoso com a cabeça coberta e algemado pudesse dar entrada no Tribunal.
No
sábado foi o funeral em Santa Teresa. Eram duas horas e a Catedral estava à
cunha de gente.
Nas
ruas um mar de gente de todas as condições sociais, pretos e brancos. A Polícia
comandava o trânsito. E entra à hora marcada a urna de cedro da Bernuda com o
corpo da Sãozinha, envolto em sedas, com o seu uniforme da escola, gravata no
pescoço, crucifixo nas mãos. O seu corpo embalsamado, sorria. Era a Sãozinha,
tal e qual. Não se viam os sinais da morte. O povo chorava e misturava as suas
lágrimas com o doloroso choro da mãe.
As
cerimónias foram conduzidas com cânticos de aleluia e lágrimas de saudade. A Missa
foi celebrada e presidida pelo Monsenhor Filipe. O senhor Bispo assistira no
trono. A missa foi dos anjos. Houve sermão em Português e em inglês. No sermão
em Português, o pregador comparou a Sãozinha com a Santa Maria Goretti e disse
que a povoacense Sãozinha será, um dia, a primeira Santa canonizada da Bermuda.
Goretti tinha irmãos, era de família pobre, era a mais velha dos irmãos, tinha
11 anos, pela pureza foi morta. Onde está a diferença entre Goretti e Sãozinha?
Questionou o pregador.
Na
saída da catedral foi tocada a nona sinfonia de Beethoven, pedindo e cantando
ao Senhor por intermédio da Sãozinha, para que “Os Homens Voltem a Ser Irmãos”.
Saiu
o cortejo fúnebre rumo à sua última morada. Milhares e milhares de pessoas
pelas ruas do percurso. São dois quilómetros e meio até ao cemitério. Centenas
de carros seguiam atrás do enterro. Uma apoteose!
Chegada
ao cemitério, muitas lágrimas e gritos dolorosos de dor. Há quem peça vingança:
mas a Sãozinha perdoou, ela é uma santa.
Depois
de algumas orações, a custo recitadas, ia ser coberto de terra aquele corpo
virgem e mártir, mas a mãe amarrou-se à urna não querendo deixar a filha.
Até
o tempo que tinha estado agreste e frio, no dia do funeral foi de primavera.
A
urna e o funeral custaram umas boas dezenas de milhares de escudos, sendo
oferecida pela funerária BULEY-GRAHAM, em atenção à comunidade Portuguesa e à
família Furtado.
Túmulo da Sãozinha no Cemitério de S. João, L. Loução |
Por
fim foi sepultada provisoriamente na secção 4, sepultura 25-A, a menina que foi
martirizada pela sua pureza.
O
corpo da Sãozinha regressou à Povoação, Freguesia de Nossa Senhora dos
Remédios, Lomba do Loução a 20/08/1978, encontrando-se num túmulo privativo de
mármore.
“Sãozinha, lá no céu onde te
encontras, pede ao Senhor por todos nós”
Um
Olhar Povoacense
agradece à Sr.ª Margarida Ferro a sugestão para pesquisarmos e relatarmos esta
história em memória da povoacense Sãozinha, bem como ao seu irmão Paulo Furtado
pela sua prestimosa colaboração e cedência de informação.
Cemitério de São João, Lomba do Loução, onde está sepultada a Sãozinha |
A Casa Ofertada pelos Amigos da Bermuda à Família Furtado, L. Loução |
lembro-me como se fosse hoje..meus pais adoravam a Saozinha e é verdade...ela queria ficar connosco!Paz à sua alma!
ResponderEliminarI lived in Bermuda in 1978. I was a teenager. I remember Connie and this tragic story and my heart goes out to her and her family. I will be back in Bermuda in January 2018, I know it will be close to 40 years. I would like to honor Connie in some way. Do you know if any of Connie's family is still in Bermuda?May you all have comfort and peace.
EliminarYes, his younger brother, Maximino, is working in Bermuda
EliminarI just realized... today is her birthday. November 8th.
EliminarQue olhes por nós lá do Céu, Connie, minha querida priminha ( de grau afastado ) e amiguinha de infância. Chegámos a brincar juntas e tenho lindas fotos contigo. Ainda tenho os teus brinquedos que a tua mãe me deu, depois da crueldade que te fizeram.
ResponderEliminarÉS UM ANJO NO CÉU QUE VELA POR NÓS!
My heart goes out to the family of Connie, to all who love and miss her. I remember her. I lived in Bermuda in 1978.
ResponderEliminarHello, I lived in Bermuda at the time this terrible tragedy happened to Connie. I remember her well. Could you please email me in reply and in regards to this article? Thank you so much for sharing this article in memory of Connie. I know she has a special place in heaven. Thank you, Keri
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