É verdade que vivemos
o presente perspectivando o futuro, um futuro que é incerto e vive sempre na
incerteza, até porque, não sabemos se a ele chegamos com vida e saúde, mas de
uma coisa podemos ter a certeza é que no presente temos a capacidade de reavivar
a memória recordando com alegria o passado. Passado este, que de alguma forma
nos marcou profundamente quer pela positiva quer pela negativa.
Reavivando estas memórias de outrora há
alguém de quem me recordo frequentemente com emoção, pois foi uma pessoa que marcou
pela positiva a minha infância e juventude, bem como, estou certo, o de muitos
Povoacenses da minha geração. Esta pessoa que desapareceu do mundo dos vivos
prematuramente deixou marcas na sociedade Povoacense. Ela era uma pessoa cheia
de vida sempre muito ativa e sempre pronta a embarcar em novos desafios, logo
que úteis à sociedade. Refiro-me a uma grande mulher cujo percurso de vida foi
dedicado aos mais pequeninos bem como aos jovens desta terra. Nasceu a
8/12/1946 e é de seu nome Zélinha Linhares.
“Criados
por Deus e para Deus a ele regressamos, no dia em que desfeita esta morada
terrestre uma nova morada nos espera no Céu! Para Zélinha Linhares esse dia
chegou aos 50 anos de vida, a 25 de Junho de 1997”.
Lembro-me desta grande mulher desde criança,
e foi no jardim infantil que muitos rapazes e raparigas da minha geração
tiveram o primeiro contacto com a Zélinha, mulher que adorava-mos
principalmente quando pegava no seu violão e com os seus enérgicos dedos fazia
vibrar suas cordas produzindo o som perfeito para em conjunto cantar-mos
alegremente lindas canções. Também era uma excelente contadora de histórias,
ficava-mos embebidos quando Zélinha sempre com o seu amigo inseparável, o seu
violão claro, nos fazia viajar a outra dimensão. A pior hora para mim era
depois do almoço, tinha-mos de dormir a cesta e birra aqui, birra ali, com
muita malícia fazia-nos incutir suas regras, a verdade é que éramos crianças
terríveis. Lembro-me de numa das tardes de receio eu e mais dois ter-mos fugido
do colégio e ter-mos ido beira mar fora brincar. Zélinha e as outras
responsáveis ficaram, claro, apavoradíssimas e quando aparecemos foi uma
reprimenda forte e feia de modo a que nunca mais se repetisse tal ato.
Mais tarde aquando da passagem para a
primária Zélinha continuaria a acompanhar-nos, agora na catequese, era sem
dúvida uma mulher com determinação inconfundível, mulher de fé, mulher dedicada
às causas da sua terra, e mais uma vez lá estava ela a dar o seu contributo à
sociedade incutindo a palavras de Deus e os bons valores aos meninos que
partiram do jardim de infância rumo à adolescência.
Na passagem para o Externato agora mais
crescidos Zélinha volta a acompanhar-nos, desta feita esta mulher mais uma vez
contribui de forma relevante na sociedade, foi uma das pioneiras do nascimento
dos escuteiros nesta Vila. O agrupamento 766 da Povoação veio dar um novo
alento a toda aquela rapaziada que na força da juventude desejava aventura.
Nesta fase da minha vida vivi realmente momentos que jamais se apagarão de minha
memória. Reunia-mos uma vez por semana desenvolvia-mos diversas atividades, as
mais esperadas, desejadas e divertidas, sem dúvida os acampamentos, caminhadas,
acantonamentos, carnaval e Natal. Quem não se lembra do primeiro acampamento
nas Araucárias na Lomba do Botão aonde à roda da fogueira e ao som do violão da
Zélinha cantava-mos, dançava-mos, sua energia e alegria contagiava-nos de tal
forma que até os mais tímidos saíam do casulo participando naturalmente no
animado convívio. Aproximando-se o Natal toda a preparação para a festa que
reunia toda a família escutista era muito animada e contagiante, Zélinha
dedicava-se com mais afeição aos mais novos do agrupamento, os lobitos, coisa
que não era de admirar numa mulher que adorava crianças, mas nunca deixava de
acompanhar os mais crescidos que outrora tinham passado por suas mãos. O
Carnaval era mais uma época aguardada com expectativa por todos, e mais uma vez
esta mulher com o seu espírito jovial e sempre animado empolgava o grupo na
preparação e organização do desfile pelas ruas desta Vila. Enfim, muito mais
havia a contar sobre esta Povoacense que dedicou parte da sua curta vida a esta
sociedade.
Zélinha Linhares partiu há 21 anos e
recordo com emoção esse dia. Foi um momento doloroso ver partir aquela mulher
que antes da sua prolongada doença demonstrara todo o seu amor pela vida, pois
irradiava energia e muita alegria. Partiu assim rumo a outra vida num dos
funerais mais bonitos que presenciei neste concelho. Foi um mar de juventude
com semblante carregado e lágrimas a fluírem cara abaixo que em profundo
silêncio transportando bonitas e coloridas flores acompanharam Zélinha à sua
ultima morada, como a querem dizer até sempre e obrigado por tudo de bom que
nos deste e proporcionaste. Realmente demonstrativo de como esta mulher deixou
a sua marca perante muitos jovens Povoacenses dos quais hoje muitos já
constituíram família.
Terminando
lanço aqui um repto a quem de direito para que num futuro próximo possa ser
atribuído a uma rua a toponímia em sua honra, para que todos se lembrem o
quanto foi importante para a nossa comunidade esta ilustre Povoacense.
Com muita saudade
Pedro Damião Ponte
“Não
morro, entro na Vida”
(St.ª Teresinha)
O
amor busca o bem por todo o lado, o amor não tem inveja, o amor não é
fanfarrão, o amor não cria ilusões.
O
amor não se dá por ser bonito.
O
amor não se busca a si mesmo.
O
amor não deixa que lhe amargurem a vida, nem é rancoroso.
Nem
se alegra com os enganos dos outros.
Regozija-se
com todas as coisas boas que acontecem.
O
amor suporta tudo, o amor espera tudo, o amor aguenta tudo.
O
amor não acaba nunca.
(São
Paulo)
“Senhor,
Brilha
para a Zélinha a luz eterna, juntamente com os Vossos Santos para sempre,
porque Vós sois bom. Dai-lhe, Senhor o eterno descanso entre os resplendores da
luz perpétua.”
Povoação,
segunda-feira, 25 de junho de 2018.
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