sábado, 27 de julho de 2019

“FAMÍLIAS DO VALE DAS FURNAS” REGISTADAS EM TRÊS SÉCULOS NUMA INVESTIGAÇÃO PIONEIRA


“Os Açores são um viveiro de estudiosos da ciência das Genealogias”, diz Gualter Furtado no lançamento da obra de Luís Rodrigues
São sete volumes e um livro de índices que regista todas as famílias das Furnas ao longo de três séculos. Trata-se de uma genealogia do historiador Luís Miguel Rodrigues Martins. Depois desta obra ter sido lançada na Igreja de Nossa Senhora da Alegria, nas Furnas, integrada no Programa das Festas de Sant’Ana deste ano, ontem, a cerimónia de lançamento teve lugar na Biblioteca Pública e Arquivo Regional de Ponta Delgada, tendo o historiador, também ele furnense, destacado o facto de se tratar da mais completa obra do género nos Açores um caso inédito na genealogia açoriana, passando as Furnas a ser é a única freguesia portuguesa a dispor de uma obra similar.

“Famílias do Vale das Furnas” é o retrato da história genealógica de todas as famílias que se radicaram nas Furnas ao longo do período que medeia 1671 a 2017, numa investigação que levou 34 anos a ser completada e que cobre mais de um milhar de famílias em 4500 páginas.

Furnas, um cenário idílico de vivências

Na ocasião, a directora da Biblioteca, Madalena San-Bento,  destacou a força da natureza e a força da fecundidade daquela freguesia do concelho da Povoação, sublinhando que não são só os açorianos que se apaixonam por aquela terra mas também os estrangeiros, uma vez que nas Furnas é tudo muito sui generis, desde a humidade que entranha na pele aos cheiros e sabores e às belas paisagens, assim como as suas gentes hospitaleiras. Aqui recordou uma máxima do avô, José de Oliveira San-Bento: “Feliz do Homem que possui uma chave para abrir uma porta das Furnas”, lembrando que nunca teve nenhuma mas que devido à hospitalidade dos pais de Gualter Furtado teve oportunidade de viver nas Furnas momentos inesquecíveis, desde a preparação dos tapetes para as procissões, aos convívios matinais e ao serão, aos banquetes gastronómicos (…) Partilhei felizmente o cenário idílico das Furnas com as suas gentes” e agora há um conjunto de livros que fala das pessoas, e destas pessoas, que “são poderosas achas lançadas para a memória furnense”, regista Madalena San-Bento.

Presente também no evento, o Secretário Regional para as Relações Externas, Rui Bettencourt, destacou a importância da obra pela “grande profundidade e pelo enorme trabalho de pesquisa” feito ao longo de mais de três décadas, lembrando que é nas “Furnas que temos concentrado tudo o que é belo nos Açores. É uma ousadia, disse, “mas é ali que temos beleza particular, beleza eterna que se prolonga para o futuro” registada numa obra que “coloca as pessoas que ao longo dos séculos moldaram as Furnas”. E aqui o governante destaca uma vez mais a importância da obra pelo enfoque que o historiador dá às pessoas.

“Esta obra centra-se na beleza humana, o que é muito importante. É importante olhar para as pessoas e para as suas dificuldades e sucessos. Cada vez mais temos de ter a consciência da identidade açoriana, pois o que temos de fazer para o futuro tem muito a ver com o que fomos”, lembrando que em Estratégia há pontos que importa reter nesta visão: “Desconhecendo as dificuldades enfraquecemos e conhecendo as dificuldades enriquecemos”, recorda Rui Bettencourt. Em nome do povo das Furnas falou José Manuel Oliveira Melo.
Obra retrata a história do Vale das Furnas

A apresentação da obra esteve a cargo do economista Gualter Furtado que destacou desde logo o facto desta obra ser também a História do Vale das Furnas com início antes dos seus primeiros habitantes com famílias estruturadas, isto é, desde o início do Povoamento da Ilha de São Miguel.

Gualter Furtado fez questão de fazer o que considerou ser “Uma declaração de Princípio: Não sou Historiador e muito menos estudioso das Genealogias. Sou um Furnense que nasceu no Vale das Furnas com formação em Economia e Gestão, mas considero não ser incompatível o sentimento que sinto e vivo de considerar que os Açores são maiores e melhores se forem considerados como um conjunto de 9 Ilhas no respeito das suas diversidades, com o amor profundo que sinto pela minha terra Natal que é o Vale das Furnas”.

Recordou que teve “a felicidade de nascer numa rua de contrastes, mas com uma presença de Famílias muito cultas para a época e que me ajudaram a crescer. Uma nota para referir que no dia que fiz 9 anos, no dia 2 de Fevereiro de 1962 (uma quinta feira) o meu Avó Manuel Furtado Sachinho ofereceu-me o Livro de Urbano Mendonça Dias a História do Vale das Furnas, e que me acompanha até aos dias de hoje. À volta da minha rua nas Furnas coexistiam 3 Presidentes de Junta de Freguesia em épocas diferentes, músicos, carpinteiros, artistas plásticos, um ensaiador de peças de teatro, a que se juntavam no Verão o Dr. Jacinto Soares de Albergaria e nos cruzávamos com os Hintze Ribeiro, várias Senhoras solteiras de idade avançada mas cultas que faziam questão de nos ensinarem a ler, escrever e contar”.

“Os Açores são um viveiro de estudiosos da ciência das Genealogias”. É assim que Gualter Furtado recorda grandes vultos da nossa história, como por exemplo Gaspar Frutuoso (o Pai das Genealogias dos Açores o maior de todos e o que nunca se enganou, como escreveu Jorge Forjaz ; Rodrigo Rodrigues (com a monumental obra sobre as Genealogias da Ilha de São Miguel e Santa Maria e com mais 40 anos de Investigação); Hugo Moreira era um trabalhador incansável; Jorge Forjaz (considerado por muitos o maior Genealogista Português da actualidade); António Maria Mendes e Luís Rodrigues Martins, entre outros. E por haver um grande entusiasmo à volta desta área de estudo, o economista furnense recorda que investigadores fundaram nos inícios do ano de 2000 uma Associação com Sede na Graciosa para debaterem assuntos relacionados com o estudo das Genealogias nos Açores. “É neste movimento e ambiente que se insere o Luís Rodrigues Martins. Trata-se de uma área do conhecimento que deveria ser incentivada e acarinhada por todos”, opina.

Gualter Furtado sobre o que levou Luís Rodrigues a escrever a genealogia dos furneses centra-se na memória de que, tal como refere o seu autor, “a vontade de saber mais e partilhar com os outros (a sua Licenciatura em História Científica ajudou muito) e querer responder a um desejo do Avó o Senhor Benjamim Rodrigues entretanto falecido, que segundo a Avó lhe teria dito que o Avô morreu com o desgosto de não ter sabido as suas origens familiares”. E para descobrir as suas origens, começou por investigar a sua Família mas depois ele abarca um projecto mais ambicioso e diríamos mais consentâneo do que deve ser um investigador das genealogias e para o qual o estudo da sua família não é o principal. O principal deve ser o estudo das outras famílias e o objecto do estudo, pioneiro e inovador, a partir de uma freguesia, “quanto mais alargado e abrangente é melhor, embora existam trabalhos de Genealogias de Famílias com muito Valor”.

Interessante, e Gualter Furtado destaca esse ponto, é que “as Crianças que nasceram ocasionalmente nas Furnas porque os pais estavam em férias nas Furnas, também estão contempladas. São várias as situações incluídas nesta Obra. Tem 1027 capítulos, o que corresponde às Famílias do Vale das Furnas em estudo, mais os expostos, que eram as crianças abandonadas e entregues na roda dos expostos em Vila Franca do Campo e a que pertenciam as Furnas até à criação do Concelho da Povoação em 1839, data a partir da qual as Furnas passaram a pertencer ao Concelho da Povoação (como curiosidade as Furnas ganham o seu estatuto como Freguesia em 1791, logo 48 anos antes de passarem para o Concelho da Povoação”.

Em 1630, ocorreu a grande erupção vulcânica que praticamente destruiu todo o Vale das Furnas, reduzindo-o a cinzas, a que se seguiu o abandono dos Eremitas do Vale e o seu total despovoamento.  As pessoas iam à Furnas mas não lá permaneciam e Gualter Furtado os primeiros moradores do Vale das Furnas, com carácter permanente, vieram da Lomba da Maia, Maia, Achada, Povoação, Fenais de Vera Cruz, Nordestinho, Achadinha, e Ponta Garça.

Segundo Luís Rodrigues Martins, de 1671 a 1710 viveram nas Furnas 49 Famílias, sendo 48 originárias de São Miguel e a outra de outra Ilha dos Açores. E assim começa a Genealogias das Famílias do Vale das Furnas (1671-2017). “Uma Obra que fazia falta e será certamente muito útil às Famílias das Furnas, aos Estudiosos das Genealogias, e à Cultura e História dos Açores”, remata Gualter Furtado. 
In Jornal Correio dos Açores, por Nélia Câmara, 26 de julho de 2019.

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