sábado, 5 de agosto de 2017

LEMBRO-ME COMO SE FOSSE HOJE

O residir com meus pais e irmãos no primeiro andar de “um casarão” localizado em St. Antão – Santa Maria pertencendo à família Figueiredo, noite - dia de Outono que o louco, louco vento batia insistentemente à porta da galeria, parecia que soprava de todo o lado... não sendo noite estrelada de luar envolvia-nos manto negro e o pasmo de fantasma imaginário, um apagar de luz e alguns familiares deitavam-se como as galinhas – num colchão de folhelho fino previamente  escolhido e desfiado aninhava o corpo de adolescente desenhando em quatro, amolgando este com uma covinha que amornava com o calor do corpo coberto com cobertor “que gostoso” ficava como que embalado no corpo de Marfu. – Eis que chega a manhã, um despertar – Benjamim, é a hora de erguer, sai da cama!


Suavemente abanava a mãe meu corpo – um espreguiçar, um ou dois bocejos e abandonava a “doce caminha adorável companheira” em lavatório metálico ligeiro passava o rosto com água fresca, um arrepio, o enxambrar veste que veste para aquecer, vestuário modesto, saí de casa a mando da mãe Rosa para comprar pão na Padaria Batista. Lembro-me como se fosse hoje... Aquela manhã de Outono ventosa, rodopiava a folhagem numa louca dança alada de quando em vez um aglomerar de folhas multicolor no caminhar brincava o vento comigo, saca de retalhos numa mão, na outra uma nota de 20 escudos com efigie de Sto António de Lisboa, um passar de mão para mão, um troca- troca ora a saca ora a nota e eis como se fora magia somente vejo a saca... “Entrei em pânico” bem tentei descobrir o Sto António na folhagem, brincalhão que é o Sto António mais se escondeu – implorei – implorei – Ó Sto António aparece que prometo ser vosso devoto mas o Sto não aceitou o ajuste. Desiludido regressei a casa – interrogou minha mãe – vens de saca vazia – a padaria não tem pão? Respondi – choraminguando – o vento levou o dinheiro... Que grande injustiça; levei uma tareia e vento safou-se...

Benjamim Carmo 

Recordar dona Madalena  Monteiro Férim – de livro da autora - Preludio para o dia perfeito.

CARTA AO LOBO

Meu irmão vou dizer-te
Do terror da menina
Na distante ilha atlântica
Nem o mar te detinha
se era noite de vento
e eu desfazia a trança
e era medonha a história
onde sempre surgias

ouvia o teu uivar
no sótão aguardando
o meu sono o meu corpo
o meu grito de espanto
ninguém jamais te viu
mas de susto povoaste
as longas invernias
onde nunca aportaste

meu irmão assassino
minha fera vestida
com meu bife de festa
nos mitos escondida
é preciso que existas
porque sem ti a Terra
seria mais vazia
e a noite era completa

Anexo – Quando os lobos uivam estão famintos. Todos temos por lei cartão de cidadão; e somos contemplados com mais um o que sai de linguagem insolente de alguém convencido que é dono da verdade…

Quanto Mona Liza sorriso de esgar carente de amor.

Povoação, sábado, 5 de agosto de 2017.
  

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