Nunca
é demais salientar, e fazer sobressair, o facto de a última vítima do regime de
Salazar ter sido um micaelense: João Guilherme do Rego Arruda, natural da
Freguesia de Santo António (Capelas).
O
dia 25 de Abril de 1974 foi, para muitos, dia de liberdade, de muita alegria e,
acima de tudo, de muita esperança. João Guilherme Arruda, revolucionário ativo,
não teve oportunidade de viver o sonho pelo qual lutou: foi a última vítima da
repressão do Estado Novo.
Com
o processo de revolução em marcha, naquele dia, as universidades estavam
fechadas, e a Faculdade de Letras de Lisboa, onde o João, de vinte anos,
frequentava o segundo ano do curso de Filosofia, não foi exceção. Muitos dos
alunos saíram, então, para os locais onde se desenrolavam os principais
acontecimentos políticos.
Como
muitos, o João esteve na rendição do Quartel do Carmo, onde se encontrava o
presidente do conselho, Marcelo Caetano. Ao ouvir-se que a PIDE havia disparado
sobre as pessoas (cerca das 14.15h) acorreram, rua abaixo, para a frente do edifício
da PIDE, de má memória, na Rua António Maria Cardoso.
Pressionados
pelos populares, que tentavam tomar o edifício, membros da PIDE/DGS dispararam
rajadas de metralhadora sobre a multidão que se encontrava na rua.
Os
tiros, vindos de uma janela do edifício, provocaram dezenas de feridos e cinco
mortos, entre os quais, o João Guilherme.
Sabemos,
hoje, pela boca do Capitão-de-Abril, Vasco Lourenço, que os comandos da
Amadora, chefiados por Jaime Neves, deveriam ter tomado a Sede da PIDE/DGS, mas
não o fizeram por razões pouco abonatórias para Jaime Neves, que em abono da
verdade nunca foi homem de Abril.
O
tiro que atingiu a cabeça do João não provocou a sua morte imediata: João
Guilherme foi levado para o hospital , onde, mais tarde, viria a falecer.
Sem
filiação a nenhum dos partidos de esquerda da época, como o PCP ou o MRPP, João
Guilherme participava nas ações de ambos, “desde que fosse para dar pancadaria
no governo”, como gostava de dizer.
A
distribuição de cartazes e comunicados de propaganda política, ou a
participação em greves e boicotes às aulas eram atividades frequentes na vida
do João.
Era
um rapaz “muito revolucionário e inteligente”, sendo dos poucos que lia Mao Tsé
Tung. Não esqueço que foi o João que me ofereceu o livro “Portugal e o Futuro”
do general António de Spínola, que acabou por ser o prenúncio de uma Revolução
Anunciada.
O
João Guilherme nunca recebeu a homenagem a que tinha direito, nem a família a
mais pequena recompensa, pese embora o facto de Mota Amaral ter mandado
celebrar missas e visitar o cemitério durante alguns anos e Manuel Arruda,
presidente da Câmara de Ponta Delgada ter-lhe prestado homenagem com uma
romagem ao cemitério aquando das comemorações dos 25 anos do 25 de Abril.
Presidência
da República, Assembleias da República e Regional, Governos da República e
Regional, para quando uma Homenagem a estes 5 mortos de Abril?
Em
1980 foi descerrada uma placa a frente do edifício da PIDE, retirada, por ser
inadequada ao condomínio de luxo que hoje lá existe, mas que graças aos
Cidadãos por Lisboa e a Helena Roseta, foi recolocada no sítio original, onde
estão gravados os nomes dos 5 heróis de Abril que Abril não viram.
Foi
com espanto que ouvi o Presidente da Associação 25 de Abril dizer que pensava
que só tinham existido 4 mortos. Para que os seus nomes não desapareçam, quando
a memória de Abril nos faltar, aqui se registam os “Homens de Abril que não
viveram Abril:
António
Lage, 32 anos de idade.
Fernando
Luís Barreiros dos Reis, de 24 anos de idade, natural de Lisboa.
Francisco
Carvalho Gesteiro, de 18 anos de idade, natural de Montalegre.
João Guilherme Rego
Arruda, de 20 anos de idade, natural dos Açores e estudante em
Lisboa;
José
James Harteley Barneo, de 37 anos de idade, natural de Vendas
Por: Manuel
de Sá Couto
Fonte:
Açores 9, Abril de 2011
Fotos:
DR
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