REPIQUES DA SAUDADE – Portuguese
Times – Ferreira Moreno
Lembranças do Tabico
António Freitas da Câmara, mais
conhecido simplesmente por Tabico, alcunha que de há muito lhe corre na família,
por largos anos representou p'ra mim o nome de um dos nossos populares
repentistas ou improvisadores, emprestando grande animação às tradicionais cantigas
ao desafio. Mais tarde, já na Califorlândia, descobri ser o Tabico
igualmente um talentoso artista cómico, além de cantor-intérprete do nosso
folclore. Isto ficou plenamente confirmado diversas vezes, quando o
Tabico nos visitou nuns espectáculos da "Caravana Açores".
Natural de Santo António Além-Capelas, ilha de S. Miguel, onde nasceu em
1941, o Tabico reside no Canadá desde
1970, onde há poucos anos atrás fui
obsequiado com um almoço típico no
restaurante da sua gerência em Toronto.
Foi a esse tempo que, mais
pormenorizadamente, me foi revelada outra faceta
na vida do Tabico, ou seja, ele passou a
representar p'ra mim um autêntico
protótipo do romeiro micalense, p'ra
quem as anuais romarias quaresmais
constituem o legítimo amor da sua alma e
coração.
O Tabico contava apenas oito anos
d¹idade quando participou na sua primeira
romaria, e aos 16 anos já se encontrava
à frente da mesma como "Mestre".
Embora emigrado continuou a deslocar-se
a S. Miguel a fim de partilhar nas
caminhadas da Romaria de Santo António
Além-Capelas.
Indivíduo de ideias e muita fé, ao
Tabico se deve a organização dum Rancho
de Romeiros Emigrantes que agora, desde
a Quaresma de 1991, percorre
anualmente a ilha de S. Miguel, numa
romaria de penitência e oração durante
uma semana.
Presentemente, desde o ano 2001,
"Mestre" Tabico dirige uma romaria
quaresmal na ilha Graciosa, incluindo
romeiros locais e dezenas de
emigrantes. Embora de curta duração,
devido à exiguidade da ilha, esta
romaria obedece aos moldes tradicionais.
Disto são testemunhas as
extraordinárias imagens colhidas num par
de "video-cassetes", que o César
Pedro me ofereceu, e que tem por título
"Os Romeiros das Américacs -
Graciosa & São Miguel".
César Pedro, continental, é casado com
Nellie, açoriana; ambos são os
realizadores do popular programa
televisivo "Gente da nossa" de Toronto.
Numa demonstração a todos os títulos
deveras louvável em propagar cada vez
mais a tradição secular destas romarias,
pois que remonta ao século VXI, o
António Tabico recentemente tomou a
iniciativa em publicar um livro
altamente informativo e profusamente
ilustrado, a que deu o título "Romeiros
- A Fé de um Povo". Além das
narrativas, quer históricas quer fotográficas,
todas eles revestidas de uma inestimável
preciosidade merecem particular
referência as numerosas quadras da
autoria do Tabico, preenchendo o livro
qual contas do rosário, que o romeiro
canta e reza na sua devoção à Virgem
Nossa Senhora.
Pela estrada caminhando,
Ó Mãe de Deus infinita,
Em altas vozes cantando:
Avé Maria bendita.
Como é linda a romaria,
Como é lindo ser romeiro,
Pedir à Virgem Maria
P¹la paz no mundo inteiro.
Louvando a Virgem Maria
Em penitência e oração;
Se não fores na romaria
Não critiques os que vão.
Avé Maria que cantas,
Romeiro por onde passas,
Enche de perfume as plantas
Das ruas, grotas e praças..
Em troca do grande amor
A Maria Imaculada,
Vamos pedir ao Senhor
Uma santa caminhada.
Romeiro, alegre caminha,
Continua a viajar
Porque a Virgem Mãe Raínha
Não te vai abandonar.
A romaria é promessa
Que se paga alegremente
E a juventude começa
A senti-la igualmente.
Todos juntos caminhando,
Desde o mais velho ao mais novo,
Na romaria mostrando
Como é a fé de um povo.
A ilha de S. Miguel
Tem a mais bonita cor,
Que foi pintada a pincel
P¹la mão do Criador.
Na ilha que nós amamos,
Nem contamos as passadas,
Que todos os anos damos,
Pelas grotas e canadas.
Tanta chuva, vento e frio,
Relâmpagos e trovoada,
É mais este desafio
P¹rá tua caminhada.
Caminha, irmão romeiro
Vence mais esta vitória,
P¹ra que sejas herdeiro,
Do reino da eterna glória.
Acolhei os emigrantes
Senhora, em vossa morada,
Que se encontram radiantes
Nesta santa caminhada.
Caminham na neblina,
Misturados com canseira;
A providência divina
É a maior companheira.
Os pobres versos que escrevo
São verdadeiros, não minto;
É da forma que me atrevo
A dizer tudo o que sinto.
Se pudesse melhor faria,
Mas melhor não sei fazer,
Porque duma romaria
Há muita coisa a dizer.
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